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MINHA HISTÓRIA
RUBIN LUIZ BENARROQUE, 68
O desespero de Jirau
Usina hidrelétrica vai inundar "o mundo" de seu Rubin, comerciante que saiu da sua casa em Mutum depois de 55 anos por causa da obra de infraestrutura do PAC
Hudson Corrêa/Folhapress
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O comerciante Rubin Luiz Benarroque, que reclama do valor da indenização que recebeu
RESUMO
Mutum-Paraná, a 160 km de Porto Velho (RO), onde viviam cerca de 300 famílias, vai ser
inundado com a construção da hidrelétrica de Jirau. O comerciante Rubin
Luiz Benarroque, 68, era
um dos moradores mais
antigos do local e tinha um
hotel, que ele está demolindo, próximo ao rio Madeira. Os quatro filhos de
seu Rubin nasceram ali.
Ele reclama do valor da indenização que recebeu para deixar o local e diz que
não tem perspectivas no
lugar para onde foi levado.
(...)Depoimento a
HUDSON CORRÊA
ENVIADO ESPECIAL A
PORTO VELHO (RO)
"Eles da hidrelétrica passaram explicando como ia
ser, mas a questão é que a
gente nunca acreditou que
aquele mundo de casas iria
acabar. A gente é acostumado dentro do mato. Quem ia
dizer que iria inundar?
Mas, todo dia, tinha [funcionário de empresas responsáveis pela usina de Jirau] fazendo pergunta de um
jeito ou de outro. Assim ia
[2009]. Sempre minha casa
servia de apoio. Cada dia, ficava mais preocupado.
Sabe havia quantos anos
eu morava em Mutum? Cinquenta e cinco. Meu filho e
minhas três filhas nasceram
lá. Eu tinha comércio, tinha
restaurante e dormitório com
20 quartos.
Ao total, tinha cinco casas
que alugava. Em que resultou? O inquilino ganhou uma
casa nova e eu não.
Muitos deles ficaram até
devendo o aluguel. Vou falar
a verdade: não fui correr
atrás porque deixei de mão,
fiquei logo injuriado.
Minha casa, eu queria que
você visse os arvoredos, todo
mundo frequentava. Hoje estou esquecido aqui [em Nova
Mutum, a 60 km da antiga,
construída para desalojados]. Não tenho para onde
olhar. Estou velho. Não tenho mais do que correr atrás.
Eu devia ter recebido mais
[em indenização por ter sido
removido de Mutum]. Acho
que recebi uns 80% a menos.
Sou um dos veteranos, um
dos pioneiros. Sofri muito
com malária.
Ali tive muita história para
contar. Meu pai trabalhava
com seringal em Ji-Paraná
[370 km de Porto Velho]. Daí
surgiu o trem e a gente veio
para Mutum mexer com a
borracha no [rio] Madeira.
Foi o tempo que nós íamos
engrossando o cangote. Estava chegando aos 20 anos.
ONÇA E CORPOS NO RIO
Nessa época, um seringueiro foi cortar [árvore no
seringal] e uma onça o retalhou todinho. Outro companheiro escutou os gritos.
Quando chegou [ao local], a
onça não tinha matado, mas
ele estava todo retalhado.
De onde aconteceu isso até
chegar a Mutum era só transporte a remo. Nós trouxemos
[o seringueiro] na canoa. De
lá [da margem do rio], carregamos o homem nas costas
até a estrada de ferro. Aí ele
recebeu os primeiros socorros de um enfermeiro. No outro o dia, o ônibus passaria
[às] oito da manhã. [O seringueiro sobreviveu].
Era só mato. Um dia [há
cerca de 30 anos] estava uma
cheia violenta e fui trazer a
mulher [à cidade] para ganhar neném. Quando voltei,
não tinha transporte.
De certa altura, na região
que se chama Palmeiral, até
chegar ao Mutum, tive que ir
a pé. Em vários pontos passei
nadando. Eu gastei um dia
[na viagem] porque saí cedinho. Eram uns 17 quilômetros na mata.
Medo dava demais, só
Deus para ajudar.
Outra coisa que conto: nós
chegamos a gastar sete dias
para chegar de Porto Velho
ao Mutum [160 km de distância] com um caminhão. O
problema eram os atoleiros.
Quando veio a rodovia, o
negócio mudou e cada um foi
procurando seu canto.
Companheiro, quando
chegou o garimpo, ainda tinha o comércio dentro da vila e fechava quando os garimpeiros andavam doidos.
Todo santo dia, toda noite,
matavam gente à bala.
Quando liberaram mulher
e bebida [na área de garimpo], em 1980, aí a mortalidade aumentou 100%. Teve
noite de chegarem dez cadáveres na delegacia.
No começo, quando descia
um cadáver boiando no rio, o
cara agarrava e avisava a polícia. Mas aí não prestou porque a polícia, em vez de agradecer, queria que o cara dissesse quem matou. Aí ninguém mais parou nada. Tinha nego morto em cima das
pedras em todo canto.
Graças ao meu bom Deus,
eu sempre tive uma boa comunicação com esse povo.
Em 1974, casei e botei o comércio de bebida e alimentos. Passei o comércio para a
beira da estrada [rodovia].
Eu pescava da janela do
meu quarto. Peguei um de
mais de cem quilos. A casa
era construída em cima da
água. Fiz pilares de cimento.
Daí você acredita que até
oito dias atrás eu estava lá
em Mutum?
Vou sentir falta demais.
Ainda não me acostumei".
OUTRO LADO
A Energia Sustentável do
Brasil, responsável pela
construção da hidrelétrica de
Jirau, afirma que pagou
R$ 475 mil de indenização a
Rubin, valor, segundo a empresa, acima do praticado no
mercado.
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