São Paulo, terça-feira, 21 de junho de 2011

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BENJAMIN STEINBRUCH

A década ganha


Fechados quase todos os dados de 2010, é possível dizer que o país entrou no século 21 com o pé direito


É OPORTUNO e importante recordar a história recente do país. O passado traz lições.
Você já se debruçou sobre uma calculadora para verificar até onde chegou a inflação brasileira na década de 1980? Trata-se de uma simples conta em que as variações anuais da inflação são acumuladas, uma sobre a outra, numa sequência de dez anos. O problema é que, no fim da conta, os dígitos não cabem em uma calculadora comum.
A inflação acumulada no país na década de 1980 atingiu a casa de 360 milhões por cento, número que foge à percepção das pessoas normais. Mas, significa, na prática, que um produto que custasse 1 cruzeiro novo (moeda nacional da época) em 31/12/1980 estaria custando 3,6 milhões de cruzeiros novos dez anos depois, em 31/12/1990. Isso se a moeda não tivesse sofrido três mudanças de nome naquela década.
Os anos 80 são chamados de "década perdida". E merecem a pecha, porque esse foi certamente o pior momento brasileiro no século passado. Não só pela inflação supersônica, mas também pelo decepcionante crescimento econômico.
A expansão acumulada do PIB naquela década atingiu apenas 16,8%. A pífia elevação da produção não foi suficiente nem para acompanhar o ritmo de crescimento da população. Assim, a renda per capita em 1990 era 5,6% inferior à de 1980, esse sim um claro indicador de um período desastroso.
Diante da "década perdida", os anos 90 parecem um renascimento.
Mas os primeiros quatro anos, antes do Plano Real, ainda foram terríveis. A inflação de 90 a 94 foi de 1,8 milhão por cento, mas depois teve início um período de estabilização. Na década, a inflação atingiu 3 milhões por cento, e o crescimento econômico continuou lento, 29% em dez anos. De qualquer forma, ficou acima do crescimento da população, proporcionando expansão da renda per capita de 9,9% de 1990 a 2000.
Os anos 90, portanto, não foram uma década perdida, mas também deixaram a desejar em matéria de melhorias para a população, porque o esforço voltou-se basicamente para a busca da estabilização.
A "década ganha" foi a dos anos 10. Fechados praticamente todos os indicadores de 2010, com o crescimento do PIB confirmado em 7,5%, é possível afirmar que o país entrou com o pé direito no século 21.
A inflação caiu dos 3 milhões por cento da década de 90 para 89% na de 10. E o crescimento do PIB teve taxa acumulada de 42% na década.
Trago esses dados por considerar que, antes de começar a prever catástrofes econômicas para os anos vindouros, é preciso olhar para as mudanças positivas que ocorreram no país e as conquistas que não podem ser perdidas.
No rastro das crises vividas hoje por alguns países europeus, principalmente a Grécia, e das ameaças que pairam sobre a economia americana, surgem previsões também catastróficas para a economia brasileira dentro de dois ou três anos.
Alertas sobre políticas equivocadas, como as que mantêm os juros artificialmente elevados e o câmbio valorizado, são sempre bem-vindos.
Mas, em vez de se aterrorizar com previsões catastróficas, o país precisa se preparar para o caso de se confirmarem as profecias do dr. "Doom" Roubini, de uma nova recessão mundial em 2013.
O grande trunfo brasileiro é o enorme mercado interno, com 140 milhões de consumidores com médio ou alto poder de compra. Em 2008/2009, foi esse mercado, com a chegada ao consumo das classes C e D, que garantiu a estabilidade do país em meio à maior crise mundial desde a Grande Depressão dos anos 30. O melhor seguro contra uma nova recessão global, portanto, é a manutenção e a ampliação desse mercado, com boas políticas que permitam o crescimento das rendas da população em todas as faixas.
Felizmente, temos hoje, no comando da economia, com Guido Mantega na Fazenda e Alexandre Tombini no BC, uma equipe que repudia políticas radicalmente conservadoras. Em décadas passadas, essas políticas levaram ao lento e burocrático avanço da economia e do emprego e ao baixo astral que dominou os negócios no país, sentimento finalmente superado na "década ganha" neste início de século.

BENJAMIN STEINBRUCH, 57, empresário, é diretor-presidente da Cia. Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.

bvictoria@psi.com.br

AMANHÃ EM MERCADO:
Alexandre Schwartsman



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