São Paulo, sábado, 23 de outubro de 2010

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Brasil fica isolado na guerra cambial

Especialistas não acreditam que ação coordenada seja aprovada pelo G20

Com forte entrada de dólares, real se aprecia ainda mais, enquanto China mantém sua moeda subvalorizada

SHEILA D'AMORIM
DE BRASÍLIA

Um dos mais prejudicados com a guerra cambial deflagrada no mundo, o Brasil esbarra na falta de apoio à proposta de uma solução articulada entre países que evite a valorização excessiva das moedas.
Nem mesmo os parceiros tradicionais do Bric (grupo integrado ainda por Rússia, Índia e China) falam a mesma língua quando o assunto é conter os desequilíbrios cambiais.
O problema -amplamente debatido, mas sem consenso na reunião anual do FMI no início deste mês- foi empurrado para o encontro do G20, em novembro. No entanto, dificilmente haverá espaço para avanços nessa área, já que as economias estão em patamares diferentes e cada um está mais preocupado com a sua própria situação.
O Brasil sabe que, por aqui, essa questão tende a se agravar diante da perspectiva de aumento do ingresso de dinheiro externo para projetos do pré-sal e obras para a realização da Olimpíada e da Copa do Mundo. Com isso, a apreciação cambial já é apontada dentro do governo como o principal desafio do sucessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva logo no início do mandato.
Ainda assim, na reunião de ministros da Fazenda do G20, que acontece neste final de semana na Coreia do Sul e serve para pautar o debate dos presidentes em novembro, o Brasil não estará representado pelo ministro Guido Mantega.
Na reta final da campanha eleitoral, Mantega decidiu ficar no país. A assessoria do ministro justificou sua ausência afirmando que ele acabou de voltar de uma viagem internacional para participar do encontro do FMI, e que não vai ao G20 para acompanhar a questão cambial daqui.
Depois de adotar medidas para desestimular o ingresso de capital estrangeiro no país, o ministro trocou o debate no fórum internacional, no qual os emergentes ganharam força com a crise financeira de 2008, por conversas telefônicas.
Nesta semana, Mantega tratou da guerra cambial com o secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, e com o diretor-gerente da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy.
De Geithner o ministro disse ter obtido o compromisso de que os EUA não vão adotar políticas que desvalorizem mais o dólar. Já com Lamy, o assunto foi sobre câmbio e comércio. Segundo a Folha apurou, Lamy explicou que a OMC tem regras que podem ser invocadas caso os países avaliem que as intervenções cambiais prejudicam o comércio mundial.

PREOCUPAÇÃO
A preocupação das autoridades brasileiras é que, na ausência de uma ação coordenada no mundo, países como o Brasil terão que partir para soluções mais radicais para tentar evitar que a apreciação da sua moeda gere desequilíbrio internos.
Esse é também o receio de muitos investidores, ressaltado na mídia internacional. O "Financial Times" destacou que a atuação recente do governo brasileiro deixou a impressão de que poderão vir mais medidas.
"Não vejo nenhum cenário realista de medidas coordenadas no mundo", diz Márcio Holand, professor da Fundação Getulio Vargas.
Para ele, 2011 será um ano complicado e o próximo presidente terá que tomar medidas de controle fiscal severo, logo na primeira hora, para abrir espaço para redução da taxa de juros e, com isso, ajudar na desvalorização do real diante do dólar.
Ele defende que o governo use medidas mais extremas, como quarentena ou mesmo proibir temporariamente algumas operações estrangeiras no país. "É uma guerra declarada. Se o governo deixar, o câmbio estará entre R$ 1,20 e R$ 1,30 no final do ano que vem", prevê.


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