São Paulo, sexta-feira, 25 de junho de 2010

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Crise reflui, e unidade do G20, também

Após consenso sobre medidas no auge da turbulência, países divergem sobre necessidade de retirar estímulos

Enquanto UE dá ênfase a ajustes fiscais, EUA, Brasil e Canadá cobram manutenção de medidas de impulso à atividade

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O G20, o grupo das 21 maiores economias do mundo mais a União Europeia, nasceu como "companheirismo de bote salva-vidas", no dizer de Stewart M. Patrick, diretor do Programa de Instituições Internacionais e Governança Global do respeitado Council on Foreign Relations (EUA).
Agora, quando o G20 faz, amanhã e domingo, sua quarta cúpula, o companheirismo "se mostra difícil de sustentar na medida em que a crise refluiu", diz Patrick.
É fato: o grande ativo do G20 foi a maneira concertada com que atuou na crise iniciada em 2007, ainda com o rótulo de crise das hipotecas "subprime".
Não que todo país adotasse medidas semelhantes. Mas a direção política era inequivocamente única -e de firme respaldo a colossal pacote de estímulos para evitar que o bote afundasse.
Na cúpula de Londres, os líderes anunciaram impressionante US$ 1,1 trilhão para evitar o colapso econômico -o que dá pouco menos que toda a economia do Brasil.
Agora, no entanto, a direção política já não é unívoca: os EUA, o anfitrião Canadá e o Brasil insistem em que ainda não é o momento de retirar os estímulos.
"Num momento em que a incerteza persiste nos mercados, é imperativo que apresentemos medidas reais e críveis que mostrem que estamos comprometidos com uma recuperação sustentável e durável, para benefício dos nossos cidadãos", escreveu, por exemplo, Stephen Harper, o premiê anfitrião, aos pares do G20.
Os europeus, ao contrário, preferem começar já a consertar o buraco causado pela crise nas contas públicas. A ênfase é nos ajustes fiscais (cortes de gasto e alta de imposto), o que o jargão econômico chama pudicamente de "consolidação fiscal".
As grandes economias europeias nem esperaram a cúpula deste fim de semana para adotar o que consideram prioritário: todas anunciaram e/ou colocaram em prática programas de ajuste.

DEFICIT
Para deixar claro que a direção política já não é idêntica, basta ler trecho de artigo assinado por Lawrence Summers, principal assessor econômico da Casa Branca, e Timothy Geithner, secretário do Tesouro: "Precisamos demonstrar um compromisso com a redução dos deficit no longo prazo, mas não ao preço de sacrificar o crescimento no curto prazo. Sem crescimento agora, os deficit aumentarão ainda mais e minarão o crescimento futuro".
Não é a única discrepância entre europeus e norte-americanos: os três principais países europeus (Alemanha, França e Reino Unido) chegam para a cúpula de Toronto com a proposta de uma taxa global sobre os bancos, para financiar futuros socorros ao sistema financeiro.

PROPOSTA BARRADA
A proposta não passou na reunião preparatória que os ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais fizeram na Coreia, há um mês.
O Brasil, por exemplo, é contra, argumentando que seus bancos, que não participaram da lambança financeira que gerou a crise, não podem ser punidos agora.
Já os Estados Unidos chegam com a proposta de estabelecer "uma moldura global para a regulação financeira", conforme dizem Summers e Geithner.
As duas divergências não são, em princípio, irremediáveis, até porque reuniões de cúpula costumam terminar com um mínimo denominador comum. O problema é que um documento minimalista talvez não seja suficiente para que o "bote salva-vidas" continue navegando à plena máquina.

FOLHA.com
Leia mais sobre o G20 na coluna de Clóvis Rossi na internet
folha.com.br/pr756009


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