São Paulo, sábado, 29 de maio de 2010

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ANÁLISE SOJA

Alta do óleo nos EUA pode não afetar consumidor no Brasil

PAULO PICCHETTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Ao final de abril deste ano, uma lata de óleo de soja nos supermercados do Brasil custava, em média, cerca de 30% menos do que em maio de 2008.
Durante esse período, o óleo de soja ensaiou aumento de preço, principalmente no segundo semestre de 2009. Entretanto, nos quatro primeiros meses deste ano, recuou 7,9% em relação ao final de 2009.
Nesses quatro meses, o preço do óleo de soja na Cbot (Chicago Board of Trade), uma das principais referências do mercado mundial de commodities, subiu 3,5%.
Entre a referência do preço mundial e o preço na prateleira do supermercado brasileiro está o preço recebido pelo produtor nacional, medido como um dos componentes do Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPPA) da Fundação Getulio Vargas.
O Brasil é hoje um dos principais produtores e exportadores de soja e de óleo de soja e, portanto, esses preços estão intimamente correlacionados. Podemos ver, no gráfico em http://www.folha.com.br/1014812, a evolução dos preços do óleo de soja (transformados em números-índice para facilitar a comparação entre as diferentes quantidades de medida) na Cbot, no IPPA e no IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), mensalmente entre janeiro de 1999 e abril de 2010.
O que podemos notar no gráfico é o seguinte:
1) a volatilidade dos preços ao consumidor é menor do que nos estágios anteriores, e,
2) as variações de preço na Cbot são indicadores antecedentes dos movimentos no IPPA; os preços evoluem conjuntamente no longo prazo, porém,
3) não têm uma relação exata no curto prazo,
4) e esses, por sua vez, são indicadores antecedentes dos preços ao consumidor final.
Esses fatos podem ser explorados de forma quantitativa em um modelo econométrico. Primeiramente, a relação dinâmica entre as variações dos preços no mercado internacional e nos preços pagos ao produtor brasileiro (controlando-se para as alterações na taxa de câmbio durante esse período) mostra que, do total de variações de preços na Cbot, apenas 66% em média chegam ao produtor nacional.
Isso não ocorre instantaneamente: no mesmo mês em que os valores aumentam na Cbot, temos apenas 11% do efeito final sobre o preço do produtor nacional.
Após um mês, esse valor chega a 51%, passando a 62% depois de dois meses. O impacto total da variação só é sentido depois de três meses.
No caso da relação entre o IPPA e o IPCA, o consumidor sente em média 87% das variações do preço recebido pelo produtor, mas esse valor integral também só é percebido depois de três meses.
No mês em que o produtor percebe o aumento de preço, o consumidor só sente 18% dessa variação, passando a 63% depois de um mês, 84% depois de dois meses e finalmente 87% a partir do quarto mês.
Como esses resultados econométricos representam variações médias, eles pressupõem que um aumento no preço internacional (ou recebido pelo produtor) seja permanente, o que nem sempre é o caso: o mercado oscila continuamente em função de seus fundamentos (fatores climáticos e econômicos que afetam a produção e a demanda, questões especulativas envolvendo a taxa de câmbio entre países produtores, a formação e utilização de estoques etc.).
Dessa forma, uma oscilação de curto prazo no mercado mundial pode não ter tempo de chegar aos produtores e consumidores do Brasil.
Com isso em mente, a dona de casa pode se preocupar ao ver as elevações do óleo de soja na Cbot, mas não muito...


PAULO PICCHETTI, 48, doutor em economia pela Universidade de Illinois, é professor da EESP/FGV (Fundação Getulio Vargas) e coordenador do IPC-S/Ibre/FGV).


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