São Paulo, domingo, 30 de maio de 2010

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ANTÔNIO PALOCCI FILHO

Crescimento de longo prazo


Governar é fazer escolhas e muitas vezes deixar de fazer coisas importantes em troca das essenciais


O EQUILÍBRIO das contas públicas, ao longo do tempo e em todos os continentes, tem se mostrado, ao fim e ao cabo, o ponto nevrálgico do equilíbrio econômico; precondição necessária, embora não suficiente, ao crescimento de longo prazo.
Em geral, os governos cometem graves erros de cálculo nessa questão, incorrendo em custos sociais profundos e duradouros.
Na maior economia do mundo, o presidente George W. Bush recebeu de Bill Clinton um Orçamento superavitário. Colocou, então, seus operadores para utilizar o superavit em busca de acelerar o crescimento econômico. Eles pretendiam zerar aquela poupança ao cabo de longos quatro anos.
Nos complexos cálculos realizados por autoridades da mais alta competência, deixou-se de considerar os efeitos da então recente crise das pontocom sobre as receitas públicas.
Deu errado: o Orçamento ficou deficitário já no primeiro ano. Para "ajudar", associou-se uma política monetária pró-consumo. Os Orçamentos avançaram no vermelho ano após ano. O consumo público e privado não parou de crescer, abrindo um imenso deficit em conta-corrente. O mercado de crédito se expandiu como nunca, criando produtos nem sempre compreensíveis.
O fim dessa história todos conhecem e tem o nome da mais grave crise financeira dos tempos recentes. Os empréstimos "subprime", a quem se atribuiu a origem de todo o mal, eram apenas o elo mais fraco de uma cadeia financeira insustentável. A crise obrigou o governo americano, assim como a maioria dos governos europeus, a incorrer em novos e imensos deficit fiscais. Os ventos inquietantes que hoje vêm da Europa, ameaçando de novo a retomada do crescimento mundial, estão novamente calcados no desequilíbrio das contas públicas em diferentes países.
Os determinantes do crescimento de longo prazo são muitos. Estudos econômicos de boa qualidade têm demonstrado o papel de diferentes políticas. Xavier Sala-i-Martin, da Universidade de Columbia, rodou nada menos do que 4 milhões de combinações, de 62 diferentes variáveis de diversos países, para estudar esses fenômenos.
Esse e outros estudos demonstraram que educação de qualidade, acesso aos serviços básicos, bons níveis de poupança e investimentos em infraestrutura, assim como mercados financeiros fortes e bem regulados, promovem, efetivamente, o crescimento. O mesmo vale para a redução da desigualdade e para a redução de barreiras comerciais, principalmente contra bens de capital, essas pelo efeito na transferência de tecnologias.
Finalmente, a análise confirma a qualidade das instituições e sua capacidade de apoiar a boa governança pública e privada. Mas, independentemente do papel de cada uma dessas variáveis em um ou outro cenário, esses estudos são unânimes em constatar que não há crescimento de longo prazo sem equilíbrio fiscal e de preços.
Em nossa história econômica, a questão fiscal esteve no centro de boa parte dos nossos desacertos. Já a melhora do quadro fiscal, na última década, garantiu a ampliação dos programas sociais e dos investimentos públicos, além de uma inédita ação contracíclica no enfrentamento da crise recente.
Conter despesas não é uma tarefa simples nem agradável. Isso porque, em geral, as proposições de novos gastos são de boa-fé e cheias de mérito. Mas governar é exatamente fazer escolhas e muitas vezes deixar de fazer coisas importantes em troca das essenciais. O fato positivo das boas escolhas, entretanto, é que os impactos para a sociedade costumam ser altamente positivos e duradouros.
Em outras palavras, quando o governo entende que não pode fazer tudo e deixa de fazer algumas coisas em nome do equilíbrio de suas contas, transmite efeitos positivos ao conjunto da economia, sustentando a estabilidade e o crescimento, permitindo que, ao longo do tempo, a própria sociedade amplie suas escolhas e suas realizações.

ANTÔNIO PALOCCI FILHO, 49, deputado federal (PT-SP) e ex-ministro da Fazenda, passa a escrever mensalmente, aos domingos, neste espaço.


AMANHÃ EM MERCADO: Maria Inês Dolci

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