São Paulo, terça-feira, 31 de agosto de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Lagos defende mais impostos no Chile

Para o ex-presidente, a tributação é uma solução de curto prazo para melhorar a distribuição de renda no país vizinho

Ricardo Lagos diz que desigualdade social é entrave para América Latina crescer como os emergentes asiáticos

NATÁLIA PAIVA
EM SANTIAGO

Ex-presidente de um país elogiado pela ampla participação privada -responsável por 80% dos investimentos do país- e pela carga tributária atraente para as empresas -17%, ante 35% no Brasil-, Ricardo Lagos defende a subida de impostos e uma maior atuação do Estado.
Essas são as armas para superar a desigualdade crônica, diz o líder da Concertação, coalizão que governou o Chile de 1990 a 2010.
Abaixo, trechos da entrevista concedida na Biblioteca Nacional de Santiago.

 

Latinos x asiáticos
Temos conseguido ter taxas de desenvolvimento asiático. Creio que um crescimento de 5% ou 6% em dez anos muda nossos países. O que passa é que temos sido incapazes de manter essas taxas por muito tempo.
No Chile, tivemos, dos anos 1990 para cá, uma taxa superior a 5%, o que nos permitiu ficar um pouco melhor. O problema com a América Latina, mais do que o crescimento, é a distribuição.

Tributação inadequada
Temos sistemas tributários inadequados. A OCDE disse que somos uma das poucas regiões do mundo, o Chile, em que a distribuição de renda antes e depois de impostos não muda. Grave, não? Mas muda após gasto fiscal.
A distribuição de renda no Chile: 20% dos mais ricos têm renda 14 vezes maior que a renda média dos 20% mais pobres. Mas, depois dos gastos fiscais, as 14 vezes são diminuídas a 7, devido ao apoio a saúde, educação e habitação. No Chile, temos um programa de habitação no qual os 20% mais pobres têm direito a casa pagando o equivalente a US$ 300.

Foco na classe média
É muito diferente derrotar a pobreza e melhorar a distribuição de renda. Em 1990, 40% estavam abaixo da linha da pobreza no Chile. Em 2000, quando fui presidente [de 2000 a 2006], eram 22%. Mas as ferramentas para baixar de 22% não eram as mesmas usadas para baixar de 40% para 22%.
Fizemos um programa especial para a "pobreza dura", a quem não chegam as medidas. Com isso, baixamos de 22% para 13%, em 2006. Agora, o número um" da agenda são setores de renda média, que deixaram a pobreza e que: 1) não querem voltar; 2) têm outras demandas. Normalmente, a maior delas é educação para os filhos.

Aumento de impostos
O problema é que, como a educação é uma medida de longo prazo, no curto prazo a solução para a distribuição de renda é a tributação. Creio que o Chile tem de aumentar os impostos às empresas, que hoje são só 17%. Não digo como no Brasil, que tem imposto muito alto, 35%, mas no Chile é muito baixo.
Não é comparável exatamente, porque o sistema de seguridade aqui é privado. Mas, se agrego tudo isso, chego a 22%. Ainda há espaço para aumentar. Por motivo do terremoto, a oposição teve esse debate com o governo. Uma parte queria aumentar para 20%, mas só por 18 meses.

Nova Constituição
Após a crise de 2008, não podemos seguir dizendo que o Estado tem de ser subsidiário. Ele tem de jogar papel essencial para conduzir a economia. No caso do Chile, é preciso uma Constituição que permita ao Estado ter um papel mais ativo.


Texto Anterior: Foco: Ex-alunos se juntam por fundo de bolsas de faculdade
Próximo Texto: Commodities: Rede de satélites "big brother" vai monitorar agricultura brasileira
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.