São Paulo, domingo, 31 de outubro de 2010

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MARTIN FELDSTEIN

A recuperação anêmica dos EUA


O estímulo fiscal não foi concebido com a eficiência necessária para permitir um crescimento sustentável


OS GASTOS dos EUA com importações excedem US$ 2,4 trilhões ao ano, mais de duas vezes superiores aos da China e mais altos que os dos 27 países da UE combinados. O volume geral de importações dos EUA varia de acordo com a força de sua economia, assim como o das exportações de outros países.
Portanto, foi uma boa notícia para todos quando o país voltou a se expandir, no terceiro trimestre de 2009, 19 meses depois de entrar numa recessão, iniciada em dezembro de 2007. Infelizmente, a recuperação se provou anêmica. Agora, após 15 meses de expansão, o nível do PIB real continua abaixo da marca que tinha antes do início da recessão.
Ainda mais preocupante, o nível de crescimento do PIB vem em queda quase desde que a recuperação começou. O PIB real subiu 5% no quarto trimestre de 2009, refletindo o fim da queda nos estoques. Em seguida, seu crescimento recuou a 3,7% no primeiro trimestre de 2010 e a 1,7% no segundo. O terceiro cresceu 2%.
A recuperação foi muito mais fraca do que em episódios passados devido a diferenças fundamentais nas causas da desaceleração e nas políticas aplicadas para promover o retorno do crescimento. Desacelerações anteriores foram causadas pelos esforços do BC para reverter ou prevenir altas na inflação, por meio de elevação nas taxas de juros de curto prazo. Nos casos em que o banco central conquistava sucesso, podia reduzir os juros em seguida e a economia se recuperava.
Mas, desta vez, a desaceleração não foi causada por alta nos juros, e reduzi-los não resultou em recuperação forte. A recessão atual foi causada pelo cálculo incorreto do custo de riscos econômicos, o que resultou em endividamento excessivo e em preços elevados de ativos. Quando essas bolhas de ativos estouraram, os domicílios perderam patrimônio substancial e os mercados financeiros se tornaram disfuncionais.
Como reduzir os juros não bastou para tirar a economia da recessão, o governo Obama decidiu recorrer à política fiscal -cortes de impostos e programas de gastos. Mas o estímulo fiscal não foi concebido com a eficiência necessária para conduzir a economia a um percurso de crescimento forte e sustentável sem intervenções adicionais. E, agora que os programas de estímulo estão chegando ao fim, há o risco de que a economia perpetue o baixo crescimento ou enfrente nova recessão.
Uma das chaves para o futuro da economia dos EUA é a demanda domiciliar. Ainda que os gastos dos consumidores tenham crescido nos últimos quatro trimestres, ajudados por transferências substanciais de renda da parte do governo, o ritmo de crescimento nos gastos domiciliares ficou abaixo do crescimento geral do PIB, porque os domicílios passaram a elevar sua poupança.
Um índice de poupança mais alto pode ajudar a economia norte-americana em longo prazo, mas seria uma barreira a um crescimento robusto nos próximos anos.
Um grande obstáculo ao maior consumo é a condição atual do mercado da habitação. A forte alta no preço das casas até 2006 fez com que os domicílios elevassem seus gastos, o que foi financiado em parte pela conversão de capital imobilizado nos imóveis em dinheiro para gastos. Mas os preços das casas caíram em média 40%, o que faz com que um terço dos proprietários de imóveis tenha saldo devedor maior que o atual valor de suas casas, em suas hipotecas.
A queda resultante no patrimônio reduziu o consumo, enquanto o declínio no valor de capital dos imóveis residenciais impede captação para financiar qualquer alta. E o fim recente do prazo de um subsídio tributário especial aos compradores de um primeiro imóvel levou os preços das casas a iniciar nova queda.
Caso ela continue, isso se traduzirá em recuo inevitável do consumo.
No começo do ano, as projeções econômicas davam conta de que o PIB cresceria 3% ou mais no segundo semestre de 2010. Elas foram reduzidas a menos de 2%, agora, o que não é suficiente para minorar o desemprego bastante elevado.
As novas projeções voltam a falar em crescimento de 3% ou mais em 2011. Esperemos que estejam corretas desta vez.


MARTIN FELDSTEIN, professor de economia na Universidade Harvard, foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca no governo Reagan e presidente do Serviço Nacional de Pesquisa Econômica dos EUA. Este artigo foi distribuído pelo Project Syndicate.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


AMANHÃ EM MERCADO:
Maria Inês Dolci


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