Índice geral Mundo
Mundo
Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Frustração mancha 1º pleito pós-Mubarak

Egípcios vão às urnas amanhã em meio a protestos contra militares, no poder desde queda do ditador, há nove meses

Exército é acusado de querer perpetuar 'velha ordem'; ontem, novos confrontos deixaram um morto no Cairo

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL AO CAIRO
Amr Nabil/Associated Press
Cartazes e faixas emrua do Cairo, capital egípcia, palco de protestos contra o conselho militar, no poder desde fevereiro
Cartazes e faixas emrua do Cairo, capital egípcia, palco de protestos contra o conselho militar, no poder desde fevereiro

As faixas com fotos de candidatos que se espalham pelo Cairo aumentam a confusão visual na caótica capital do Egito, sugerindo uma campanha intensa para a primeira eleição no país desde a queda do ditador Hosni Mubarak, em fevereiro.

Mas a frustração com a demora da junta militar em deixar o poder e a falta de segurança que fez disparar a criminalidade tiraram de muitos egípcios o entusiasmo de ir às urnas no pleito parlamentar de amanhã.

"Além de temer a violência, muitos egípcios devem ficar em casa porque têm a sensação de que a velha ordem continuará mandando", diz o cientista político Walid W. Kazziha, da Universidade Americana do Cairo.

Após uma trégua de dois dias, os confrontos se repetiram ontem perto da sede do governo. Um manifestante foi morto em protestos contra a nomeação do premiê Kamal Ganzouri, ex-membro do regime de Mubarak.

Ganzouri criticou os protestos e pediu dois meses de calma para poder atender às demandas dos manifestantes.

Para Kazziha, o recrudescimento dos protestos põe em evidência o "choque de gerações" no cerne da revolução inacabada.

Ele lembra que a média de idade dos generais que assumiram o poder é de 60 anos. Mais que o dobro da maioria dos revolucionários.

Ganzouri, o novo premiê, tem 78. O chefe da junta, Mohamed Tantawi, 76, passou duas décadas como ministro da Defesa de Mubarak.

Na praça Tahrir (libertação, em árabe), Tantawi é chamado de "múmia" por jovens equipados com modernos telefones celulares.

As forças políticas que concorrem à eleição também refletem o choque entre a velha e a nova ordem.

Entre os mais de 50 partidos na disputa, há 15 islâmicos e 7 associados ao dissolvido PND (Partido Nacional Democrático), do antigo regime, além de grupos liberais surgidos na esteira dos protestos de janeiro.

Ontem, o ex-diretor da AIEA (agência nuclear da ONU), Mohamed El Baradei, disse estar disposto a renunciar sua candidatura à presidência para participar de um possível "governo de salvação nacional", para tirar o país da crise política.

ISLAMITAS FAVORITOS

Banida durante a ditadura Mubarak, a Irmandade Muçulmana criou o Partido Liberdade e Justiça, considerado favorito para conquistar a maior fatia do eleitorado.

Sondagens preveem que, juntos, os partidos islâmicos obtenham até 45% dos votos. Mas a relutância da Irmandade em apoiar os novos protestos, temendo o adiamento da eleição, pode minar seu desempenho nas urnas.

O alvo principal da revolta na praça Tahrir, contudo, são os militares. De heróis ao proteger a revolta em janeiro, passaram a vilões.

"Eles querem proteger seus poderes e privilégios", ataca Hani Shukrallah, editor da versão on-line do jornal egípcio "Al-Ahram".

Apesar da escalada de protestos que deixou 41 mortos e reviveu os ares de revolução na praça Tahrir, os militares confirmaram a realização das eleições a partir de amanhã e estenderam a votação inicial para dois dias.

Será a largada de um processo em seis turnos que durará até março, quando está prevista a formação das duas Casas do Parlamento. Sua principal missão será redigir a nova Constituição do país.

Na praça, as opiniões se dividem. A maioria parece inclinada a boicotar a votação, para não legitimar o poder dos militares.

"A Irmandade e os generais têm um acordo tácito", acusa a jornalista e ativista Hala Fahmy, com máscara antigás pendurada no pescoço. "A eleição só serve para consolidar o poder dos dois."

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.