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Que fim levou a URSS

20 anos depois da queda do bloco, a Folha visita países da região e inicia uma série de reportagens para investigar o legado da União Soviética e de sua já erguida cortina de ferro

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL À RÚSSIA E AO LESTE EUROPEU

Em Moscou, uma mesquita para 10 mil pessoas é erguida ao lado de lojas de luxo. Na Moldova, parte do território vive regime "de facto" protegido por tropas russas. A Ucrânia está rachada entre a atração da Europa e laços com a Rússia. Em Minsk (Belarus), a KGB opera a duas quadras do McDonald's e segue prendendo dissidentes.

Por cinco séculos, a Rússia liderou um dos maiores impérios da história. No período mais recente, exportou o comunismo a todas as regiões do mundo e construiu um enorme arsenal bélico.

Vinte anos após o esfacelamento da União Soviética, os 15 países que emergiram tentam lidar com a herança do passado enquanto buscam o seu lugar no mundo.

A partir de hoje, a Folha publica uma série de reportagens sobre a desintegração da União Soviética, resultado de uma viagem de 17 dias por cinco países da região.

"Sair de um império e construir nações-Estado não é um evento, e sim um processo para a todas as partes", afirma Dmitri Trenin, diretor do Centro Carnegie de Moscou e autor do recém-lançado "Post-Imperium: a Dinâmica da Antiga Eurásia Soviética".

A herança mais complexa coube, obviamente, a Moscou, a ex-superpotência mundial que hoje busca se firmar como um poder regional no seu antigo espaço de influência num mundo cada vez mais polarizado entre os Estados Unidos e a China.

Internamente, o país vive um processo de centralização do poder. Figura hegemônica na política russa, Vladimir Putin encerrou, ao longo dos anos 2000, a crise institucional e econômica dos anos 1990, promoveu reestatizações de grandes empresas e reverteu reformas democráticas, como a eleição direta para governador e senador.

Na política externa, freou a aproximação com o Ocidente feita pelo antecessor, Boris Ieltsin, renovou a presença russa no antigo espaço soviético e vem se promovendo como um "país emergente" dos Brics, que inclui Brasil, Índia, China e África do Sul.

Mas os desafios continuam enormes. Com uma economia pouco diversificada, a Rússia viu seu PIB desabar quase 10% em 2009 junto com o preço em queda de petróleo e gás, o maior recuo entre os países do G20.

No sul, o Cáucaso se transformou num "estrangeiro dentro do país", provocando a fuga de russos étnicos e levando o conflito até Moscou por meio de ataques terroristas. Em várias partes do território, a população diminui rapidamente. E a corrupção é endêmica em praticamente todas as esferas.

"Elementos do império ainda são visíveis -dentro e no exterior. Domesticamente, a Federação Russa é hoje um governo neoczarista, moderadamente autoritário. A fórmula operacional atual pode ser classificada de autoritarismo com o consentimento dos governos", diz Trenin.

"Como um ator internacional, a Rússia está num momento em que reconhece todas as antigas repúblicas como países separados, ainda que não veja todos como Estados estrangeiros."

DIVERSIDADE

Nos demais países, os processos de independência variaram incrivelmente: desde os bálticos, que em 15 anos trocaram a URSS pela UE e pela Otan e hoje têm alta qualidade de vida, até o Turcomenistão, com uma população pobre e regime tão fechado quanto a Coreia do Norte.

Na Europa, há ainda o chamado novo Leste Europeu (Ucrânia, Belarus e Moldova), historicamente mais ligado à Rússia e com maior dependência econômica, principalmente em relação a gás.

Na Ucrânia, territorialmente o maior país da Europa, a nação vive desde a independência uma política pendular com relação a Moscou, a quem esteve subordinada por 300 anos. Em Belarus, o russo predomina sobre o idioma local e não existem nem sequer postos de fronteira.

Os países do Cáucaso vivem situações bastante distintas. Rico em petróleo, o Azerbaijão tem boa situação econômica e vê a população crescer, raridade entre os países da antiga URSS.

Já os vizinhos Armênia e Geórgia enfrentam maiores dificuldades.

A região foi ainda palco de uma guerra em 2008 entre Rússia e Geórgia, a única envolvendo dois países ex-soviéticos. O conflito de cinco dias foi vencido por Moscou, que reconheceu a independência de dois pequenos enclaves de população étnica russa, Ossétia do Sul e Abkházia.

Na Ásia Central, a região menos democrática de todas, a influência russa está sendo disputada pela China, interessada nos recursos energéticos, e pelos americanos, que aumentaram a presença miltar ali por causa da guerra no Afeganistão.

Apesar de países sem praticamente nenhuma experiência prévia como Estados independentes -as fronteiras foram delimitadas pela União Soviética-, apenas o Tajiquistão registrou uma guerra civil, nos anos 1990.

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