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Minha história Itzhak Levanon, 67

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

RESUMO - Último embaixador de Israel no Egito da era Hosni Mubarak (deposto em fevereiro), Itzhak Levanon, 67, encerrou sua carreira diplomática com uma experiência dramática. Na madrugada de 10 de setembro, deixou o país num avião militar, resgatado pelo seu governo. Horas antes, a embaixada israelense no Cairo fora invadida por uma multidão enfurecida, apesar de os países terem acordo de paz.

Era uma sexta-feira, eu estava sozinho em casa. Na embaixada haviam ficado somente os seis seguranças. A mesa estava posta, mas o jantar ficou intocado.

Desde maio, o ritmo dos protestos contra a embaixada havia aumentado. Arrancaram a bandeira uma vez, em outra a queimaram. Em consequência, um muro foi erguido em volta do prédio.

No dia da invasão, Israel não era o alvo inicial. O plano [dos manifestantes] era ir até a praça Tahrir protestar contra os militares.

No caminho, elementos palestinos convocaram os manifestantes a levar marretas para derrubar o muro em torno da embaixada.

Foram 13 horas muito difíceis, de tensão, gritos, telefonemas sem parar. Eu via tudo ao vivo pela TV Al Jazeera e os seguranças no prédio completavam o relato. O clima era ameaçador.

Jamais pensei que conseguiriam invadir a embaixada. Havia muito Exército em volta e geralmente os soldados dispersavam os protestos com facilidade. Naquele dia, isso não ocorreu.

Num certo momento, o chefe da segurança fez um apelo dramático: "Itzhak, eles entraram, faça tudo o que você puder." Disparei telefonemas para todos os que podiam ajudar, entre Cairo, Jerusalém e Washington.

Tudo passa pela cabeça. O medo é enorme. Eu funcionava na base da adrenalina. Aquele era o lugar em que eu passava 10, 12 horas por dia. Minha cabeça estava a mil. Até que às 4h nos retiraram do país num avião militar.

Aquilo não poderia ter acontecido. Todo país tem a responsabilidade de proteger as embaixadas. Até a invasão, minha experiência tinha sido surpreendentemente boa. Me avisaram que seria difícil, porque assim havia sido com meu antecessor. Eu cheguei pronto para o pior. O que eu vivi foi o oposto.

Eu ia à ópera, shoppings, cafés, restaurantes. Fui muito bem recebido, e o fato de falar árabe fez toda a diferença. Sabia as piadas, os provérbios, conheço a mentalidade. Pessoalmente foi uma experiência muito rica.

Já no lado profissional, a situação não era nada boa. Havia dois níveis. Com [o ex-ditador Hosni] Mubarak e os ministros, a relação era ótima. Com níveis inferiores do governo, sindicatos, imprensa, intelectuais, nada. Não quiseram relação comigo.

Mubarak não se esforçou para mudar isso. Quando era conveniente, me abraçava, tirava fotos. Quando não, achava motivos para barrar minhas iniciativas. Sempre buscou se posicionar no meio.

Não acredito que o acordo de paz entre Israel e o Egito esteja em risco. A maioria dos egípcios entende que a anulação do acordo significa voltar ao estado de guerra. Isso ninguém quer.

A situação interna no Egito não é fácil. A Irmandade Muçulmana [vitoriosa em recente eleição parlamentar] não é a mesma de quando foi fundada, em 1928. É o novo islã político, que entende onde vive. Tem suas posições, mas é lúcida.

A hostilidade aos judeus e a Israel faz parte da cultura árabe. É desagradável dizer isso, mas se o Corão chama os judeus de macacos, o que podemos esperar?

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