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Análise

Credores tapam o nariz e jogam dinheiro em poço sem fundo

MOHAMED EL-ERIAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

O cenário é o seguinte: uma abordagem de política econômica cada vez mais desacreditada dá lugar a oposição social e política doméstica crescente, protestos e violência nas ruas, divergências entre credores oficiais e, entre os credores privados, receios crescentes de um calote desordenado.

Líderes nacionais assumem compromisso de promover mais das mesmas medidas de austeridade intransigentes que não vêm conseguindo implementar.

Os credores oficiais manifestam ceticismo, mas tapam seus narizes coletivos e se preparam para desembolsar mais uma parcela de dinheiro no que temem que seja um poço sem fundo.

Soa familiar? Deveria, mas não só por descrever a Grécia hoje. É também o que a Argentina enfrentou em 2001.

A não ser que a Europa faça uma reflexão sobre as lições a serem tiradas dessa experiência, os paralelos que se estendem à Grécia podem acabar por também incluir um derretimento financeiro, uma queda profunda na produção e turbulência política.

A Argentina deu calote em dezembro de 2001, fechou seus bancos e viveu a mãe de todas as "paradas econômicas repentinas".

Foi forçada a desmontar sua estrutura econômica de maneira desorganizada, promovendo uma transição caótica e não planejada para um novo sistema de moeda, em meio a controles de capitais e confisco de bens.

É claro que a Grécia é uma economia mais avançada que a Argentina. Ela faz parte de um acordo regional muito mais forte que o Mercosul, dotado de recursos financeiros imensamente maiores e de bases econômicas e institucionais mais desenvolvidas.

Mas seu futuro vai se assemelhar ao argentino se governo e credores oficiais (ou seja, o Banco Central Europeu, a União Europeia e o FMI) não empreenderem uma correção urgente de rumo.

Para começar, deveriam parar de repetir que não existe "Plano B". Dizer às pessoas que não existe alternativa a uma política desacreditada apenas as incentiva a resistir ou a optar pelo caos.

Em segundo lugar, a Grécia e seus interlocutores estrangeiros precisam reconhecer que o plano B tornou-se criticamente necessário.

Implica em uma reestruturação econômica e da dívida muito mais profunda, além de mudanças institucionais, para que a Grécia ganhe flexibilidade maior de políticas, melhore a competitividade e promova o investimento.

Em terceiro lugar, os credores oficiais da Grécia deveriam ficar mais atentos ao retorno de sua assistência. As intervenções deveriam vir acompanhadas de pressão maior sobre os bancos para levantar capitais e melhorar a qualidade de seus ativos.

Finalmente, a integridade e a credibilidade do BCE e do FMI exigem proteção maior.

O oportunismo da Europa enfraquece a eficácia futura dessas instituições em um momento em que elas serão necessárias não apenas para estabilizar a Grécia, mas para impedir que problemas de liquidez se convertam em crises de solvência em outros países europeus e outros lugares, além de limitar o contágio global.

MOHAMED EL-ERIAN é presidente-executivo do fundo de investimentos Pimco e autor de "When Markets Collide".

Tradução de CLARA ALLAIN

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