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Análise

Classe média, "gênio" criado pelo premiê, saiu da garrafa e cobra mais liberdade

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em 2000, um desconhecido jovem líder de 47 anos empolgou os russos com promessas de reerguer uma Rússia em frangalhos.

Vladimir Putin, que havia sido lançado das sombras de seu passado de oficial da KGB para a Presidência após a renúncia do instável Boris Ieltsin (1931-2007), obteve sucesso em seus mandatos.

Surfando no preço galopante do petróleo e do gás abundantes na Rússia, ele provou-se popular e ajudou a criar uma classe média emergente no país.

O PIB per capita dobrou de 2000 a 2011; no primeiro ano de Putin no poder, havia 4 milhões de viagens internacionais feitas pelos russos, número que passou para quase 10 milhões agora.

Mas isso veio a um preço. Crescentemente autoritário, o governo transformou uma classe de ex-agentes secretos em burocratas ricos e corruptos, suprimiu eleições locais, calou a mídia eletrônica independente e pôs na cadeia empresários que não queriam jogar pelas regras do Kremlin.

O zênite do poder veio em 2008, quando fez o sucessor e reinstalou-se como premiê. Naquele ano, a Folha viu um protesto de meia dúzia de opositores ser esmagado sob a neve pela temida Omon, a polícia de choque. Repercussão em Moscou? Zero.

A volta de Putin, que será eleito hoje ou num improvável segundo turno, parecia coroar o projeto. Paradoxalmente, o pleito parece mais prelúdio de crise anunciada.

Quando 100 mil moscovitas enfrentaram temperaturas abaixo de 20 graus Celsius negativos no começo do ano para protestar contra Putin e as eleições parlamentares apontadas como fraudulentas de novembro, a Omon já não era uma opção.

O gênio criado pelo premiê, a classe média, saiu da garrafa e agora cobra liberdades. O apetite de Putin por mudanças é a grande dúvida, além do fato de que falta viabilidade oposicionista.

Parece mais fácil um nome do putinismo ganhar densidade como alternativa de poder, como o ex-ministro liberal Alexei Kudrin (Finanças).

Não ajudam nada a estagnação econômica e a necessidade de um barril de petróleo a US$ 130 para manter o Orçamento saudável.

No círculo do Kremlin, ainda há a aposta em um diagnóstico atribuído há mais de um século ao então premiê Piotr Stolypin (1862-1911), que aliava execuções a reformismo: "Na Rússia, reformas liberais só podem ser feitas se o regime endurecer primeiro, porque, para um russo, qualquer relaxamento no sistema representa fraqueza".

O vaticínio foi preciso na era Romanov e sob o comunismo. Mikhail Gorbatchov e Ieltsin fugiram à regra e acabaram desprezados. A julgar pela sua campanha macho-alfa, Putin deve seguir com Stolypin, embora bravatas e fotos sem camisa não tenham o apelo de outrora.

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