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Mudança de hábitos marca pós-tsunami

Um ano após desastre no Japão, medo de repetição faz com que população das regiões afetadas adote cuidados extras

Reforçar a despensa, pôr rádio na mochila de emergência e não comer peixe são algumas das novas práticas adotadas

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL AO NORTE DO JAPÃO

Com medo da radiação, a sobrevivente do tsunami Kasuko Kurosawa, 76, deixou de comer o peixe da região onde vive desde que nasceu. "Agora, só compro importado ou vindo do Mar do Japão [costa oeste]", diz a professora aposentada.

Moradora de Nakaminato, vila pesqueira a dezenas de quilômetros da usina de Fukushima, ela está longe da área interditada à pesca devido ao acidente nuclear. Mas a tragédia que matou cerca de 20 mil pessoas, desabrigou dezenas de milhares e espalhou radiação no entorno da usina deixou um medo profundo nos moradores.

"Agora, tomo banho e faço as refeições mais rápido", diz Kurosawa. "Mais do que a minha casa, a mudança foi dentro de mim. Eu me pergunto o que acontecerá se houver um novo tsunami."

No ano passado, dois dias depois do terremoto, a Folha encontrou Kurosawa limpando a lama de sua casa, atingida por uma onda de meio metro. Avisados pelo sistema de alto-falante, ela e o marido haviam se refugiado na escola minutos antes de a água tomar a vizinhança. Fisicamente, nada sofreram.

O casal pôde dormir na casa já no segundo dia, mas a experiência do tsunami, aliada ao noticiário até hoje incessante da tragédia, deixou os habitantes do norte do Japão com os nervos à flor da pele. O nervosismo levou a várias mudanças: as mochilas de emergência ganharam mais comida e outros itens, como um radinho de pilha.

"Antes, havia só uma lata de bolacha, estávamos preocupados com o peso. Mas agora colocamos muito mais calorias", explicou ela, enquanto desmontava a mochila.

Na vizinhança, Kurosawa conta que um censo identificou moradores com problemas de mobilidade, que não podem escapar sozinhos de suas casas. Também houve um treinamento para a preparação de almoços coletivos.

A 250 km ao norte e bem mais perto do epicentro, em Sendai, a rotina da família do médico brasileiro Douglas Sato, 36, também inclui precauções extras. O ofurô (banheira) do apartamento agora fica cheio de água, e a despensa ganhou o reforço de mais alimentos de longa duração.

Sato, a mulher e a filha estavam entre os brasileiros resgatados em Sendai por ônibus do governo brasileiro, onde também estava a reportagem da Folha. Na época, os trens estavam parados, as rodovias, parcialmente bloqueadas, e faltava combustível.

Mas, como a casa estava longe do tsunami e não sofreu danos com o terremoto, eles puderam regressar dez dias mais tarde, após a volta da luz e da água e do restabelecimento do acesso à região.

Ainda com dois anos de doutorado pela frente, Sato diz que o seu departamento na universidade voltou ao normal após dois meses e que alguns estudantes internacionais abandonaram o curso -opção descartada por ele.

"Não temos vontade de deixar o Japão por conta do incidente", disse Sato, que, no Brasil, trabalhou no hospital Sírio Libanês. "O Japão tem a questão dos desastres naturais, mas gostamos muito do país."

Colaborou ROBERTO MAXWELL

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