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Visita do papa sela união de interesses com Havana

Bento 16 quer consolidar espaço privilegiado da igreja nas reformas na ilha

Cúpula católica aposta em abertura 'segura e gradual'; analistas, porém, veem problema na lentidão do processo

FLÁVIA MARREIRO
DE SÃO PAULO

O papa Bento 16 desembarca amanhã em Cuba apostando numa união de interesses com o governo Raúl Castro que consolide para a igreja espaço privilegiado no processo de reformas na ilha.

Bento 16 verá a instituição que chefia, 14 anos depois da visita histórica de seu antecessor, João Paulo 2º, como a maior e mais influente organização fora do Estado.

"Falta ainda sistematicidade na nossa presença nos meios de comunicação, mas esse papa foi mais visto na TV que João Paulo 2º, porque se transmite agora o que ele fala na Semana Santa. Já faz cinco anos que eu digo a mensagem de Natal para toda Cuba", comemorou o cardeal-arcebispo de Havana, Jaime Ortega, em conversa com a Folha em janeiro.

O novo status da igreja se apresenta em outras vertentes. A instituição tem hoje órgãos de imprensa em que debate as reformas econômicas e aparece como ponte entre os cubanos da ilha e os da diáspora -de acadêmicos a milionários cubano-americanos radicados em Miami.

"Para o governo, interessa se aliar à única instituição com vertebração nacional e internacional num momento de mudanças que exigem sacrifícios", diz Mauricio Font, cubano diretor do "think-tank" dedicado às Américas Bildner Center, dos EUA.

"Essa visita mostra que o papa aposta suas fichas no processo de abertura 'lenta, segura e gradual'. O problema é que ela é sobretudo lenta", acrescenta Font.

CUSTOS POLÍTICOS

Mas há também custos e desafios políticos para a igreja na nova situação. O mais evidente se apresentou dias antes da visita do papa e deve pairar nos três dias de permanência de Bento 16 na ilha: como tratar os opositores do governo que querem aproveitar os holofotes sobre o papa para se fazerem visíveis?

Bento 16 rezará duas missas ao ar livre -a última delas na emblemática praça da Revolução, em Havana, na quarta-, em meio a um ambiente de forte controle de segurança do governo.

Nem o governo dos Castro nem o Vaticano estão interessados em que protestos "sequestrem" as atividades.

As Damas de Branco, grupo opositor cuja origem foram as manifestações de mulheres de presos políticos diante de uma igreja, pedem "ao menos um minuto" com Bento 16, mas ainda não obtiveram resposta.

Há quase duas semanas, a cúpula católica considerou "ilegítimo" e "irresponsável" o protesto de dissidentes que invadiram uma igreja em Havana e queriam que o papa mediasse suas petições. Dois dias depois,a polícia os desalojou a pedido de Ortega.

"A igreja já não ficou bem na foto. Na invasão, assumiram o custo e deixaram ao governo o papel quase cavalheiresco de atender um pedido", disse o sociólogo cubano Haroldo Dilla, radicado na República Dominicana.

"Essas situações inusuais serão cada vez mais usuais num momento de mudanças. Governo e igreja deveriam entender que não se pode abrir pedacinhos reservados de críticas e aspirar a que os excluídos a respeitem", afirmou.

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