Índice geral Mundo
Mundo
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Kony é orador hipnotizante, diz biógrafo

Jornalista britânico relembra encontro com rebelde de Uganda, estrela de vídeo que virou fenômeno na internet

Autor de livro sobre ele, Matthew Green diz que envolvimento dos EUA é fundamental para captura de líder rebelde

FÁBIO ZANINI
EDITOR DE "MUNDO"

Joseph Kony, o rebelde de Uganda que virou celebridade global após um vídeo denunciando seus crimes cair na internet, é a um só tempo dono de uma aura sinistra e de uma voz hipnotizante.

A descrição é de Matthew Green, biógrafo de Kony e um dos pouquíssimos jornalistas ocidentais a ter encontrado o misterioso líder do Exército de Resistência do Senhor, que já teve 5.000 combatentes e hoje está reduzido a 200.

Numa clareira no leste do Congo, em 2006, Kony surgiu cercado por crianças soldados, lembra Green. Jornalista do "Financial Times", ele é autor de "Wizard of the Nile" (mago do Nilo), sobre a rebelião iniciada por Kony em 1987, que já matou 30 mil.

-

Folha - O que o sr. achou do vídeo sobre Kony?

Matthew Green - Não é um vídeo que almeje a objetividade jornalística. O filme vem sendo criticado em Uganda porque parece insinuar que a guerra continua, mas Kony deixou o norte do país em 2005 e a região está mais ou menos em paz. Os produtores não fizeram um documentário, fizeram essencialmente propaganda, destinada a chamar a atenção para um assunto. E conseguiram.

Por que o sr. decidiu fazer um livro sobre Kony?

Pelo fato de ele ser um mistério. Há muitos anos esse homem está na floresta, promovendo um tipo estranho de guerra, conversando com espíritos e sequestrando crianças. É incrível como esse homem pode estar lutando há tanto tempo e mantendo tanta gente refém.

O que levou ao conflito? Questões sociais, econômicas e étnicas ou apenas a loucura de um homem?

É mais complicado do que apenas loucura. Por muitos anos, o povo acholi, do norte de Uganda, foi marginalizado pelo governo central. Esse sentido de alienação leva o conflito a durar tanto tempo.

Kony é popular na região?

Quando ele começou, em 1987, era um revolucionário que tinha apoio da população. Mas rapidamente ele se virou contra as pessoas que prometia proteger e as punia por não o apoiar. Ele desenvolveu o conceito do "novo acholi", uma nova raça que ele liderava e iria se impor sobre as outras. Começou a ter uma visão messiânica, totalmente irrealista. Era um tipo de ideologia que justificava cometer atrocidades contra seu próprio povo.

Como foi o encontro com ele?

Foi em 2006, na província de Ituri, leste do Congo. Havia conversas de paz, lideradas pelo governo do Sudão do Sul. Por algumas breves semanas, foi possível fazer contato com os rebeldes na selva. Foi a primeira vez em que houve acesso real a Joseph Kony. Junto com uma delegação de paz, consegui encontrá-lo.

E o que chamou sua atenção?

O que descobri é que existem essencialmente dois Joseph Konys. O homem que eu vi emergir da clareira, cercado de crianças soldados, parecia aterrorizado. Ali ele estava fora de seu habitat normal. Mas depois o vi na selva, falando com seus soldados: parecia um orador cativante, uma pessoa que tinha carisma real. Ele tem uma voz musical que consegue quase hipnotizar as pessoas. Era uma figura poderosa quando estava em seu reino, a floresta. Havia centenas de jovens cercando-o. Muitos eram crianças ou jovens adolescentes. Todos em uniformes e botas velhos, alguns com dreadlocks, outros com acessórios religiosos.

O sr. se sentiu temeroso ou intimidado?

Havia uma certa aura sinistra nele, certamente, mas não me senti em perigo porque ele estava lá para conversar. Claro, ele tinha seus seguidores ali e é uma pessoa imprevisível, então qualquer coisa podia acontecer.

O sr. conversou com ele?

Trocamos um cumprimento. Eu me lembro de suas palavras: "Sou um homem, sou um ser humano".

Ele um dia será preso?

A única maneira realista é com envolvimento dos EUA, se decidirem que é do interesse deles prendê-lo.

Leia a íntegra
folha.com/no1066631

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.