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Mali vive crise após rebeldes tomarem o controle do norte

Ao mesmo tempo, militares derrubaram o governo no sul; países vizinhos discutem uma intervenção armada

Tuaregues lutam por Estado próprio e foram armados por Gaddafi; cerca de 35 brasileiros vivem no país africano

Issouf Sanogo
Jovens do norte do Mali discutem a crise na capital, Bamaco; "o norte chora", diz cartaz
Jovens do norte do Mali discutem a crise na capital, Bamaco; "o norte chora", diz cartaz

CAROLINA MONTENEGRO
DE SÃO PAULO

Um país desértico no oeste da África, que já abrigou um império continental, o Mali, é desde a semana passada palco de uma revolta sem precedentes -e efeito colateral da Primavera Árabe.

Rebeldes separatistas, os tuaregues, tomaram as três maiores cidades do norte do Mali: Gao, Kidal e Tombuctu -patrimônio da humanidade, tombada pela Unesco.

Rebeliões tuaregues são recorrentes no país desde sua independência da França em 1960. "Os tuaregues sempre se sentiram marginalizados do sul e do governo de Bamaco. Mas o catalisador, agora, foi o retorno para o Mali de milhares de tuaregues da Líbia, que faziam parte do Exército de Muammar Gaddafi", explicou à Folha Jeremy Keenan, professor na Soas (Escola de Estudos Orientais e Africanos), em Londres.

Durante décadas, os tuaregues deixaram o Mali rumo à Líbia, por causa da seca. Muitos se juntaram às forças de Gaddafi para lutar inclusive na própria revolta líbia -que durou meses e teve como saldo a queda do ditador.

Desde o fim do ano passado, os tuaregues retornam ao Mali. "Estavam aborrecidos com o desfecho de Gaddafi, fortemente armados e pensavam: 'Passamos a vida lutando por Gaddafi e outros e terminamos perdendo, então agora vamos lutar por nosso próprio país'", disse Keenan.

Os tuaregues estão organizados sob o MNLA (Movimento Nacional para a Libertação de Azawad). Lutam pelo Estado de Azawad, região que representa 65% do Mali.

Apesar de muçulmanos, defendem um Estado secular e têm apoio de líderes locais, que firmaram um abaixo-assinado no mês passado.

"É a primeira vez que eles tomam o controle das três cidades. É a revolta mais bem-sucedida. São homens treinados, lutando contra um Exército incompetente e um governo corrupto, que acabou de ser deposto por militares", disse Keenan.

O país vive uma crise. Em 22 de março, militares derrubaram o presidente eleito Amadou Toumani Touré. A maior queixa do Exército foi justamente a falta de armas para enfrentar os tuaregues.

Antes, o Mali era retratado no Ocidente como exemplo de Estado democrático na África. Uma meia-verdade. "O país é um narco-Estado. A elite política corrupta está diretamente envolvida com o tráfico de drogas [cocaína da Colômbia escoada para a Europa]", afirma Keenan.

Outro complicador são os grupos extremistas islâmicos na região: a Al Qaeda do Magreb Islâmico (AQMI) e o Ansar Din. O MNLA se opõe aos dois e pode expulsá-los do norte. Ontem, porém, o MNLA anunciou um cessar-fogo e declarou "a liberação completa de Azawad".

A situação ganha contornos de crise humanitária. Segundo a ONU, mais de 200 mil já fugiram do Mali. Os países vizinhos fecharam as fronteiras e anunciaram sanções para pressionar os militares. O bloco do oeste da África (Cedeao) ativou forças e discute uma intervenção.

O Itamaraty estima em 35 os brasileiros residentes no Mali, diz que alguns deixaram o país após alerta e todos estão em segurança.

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