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Vila de Mubarak se envergonha dele, mas apoia aliado

Segundo turno da eleição no Egito começou ontem em meio a apatia; islâmico e ex-premiê estão na disputa

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A KAFR EL MESELHA

Enquanto o Egito voltava ontem às urnas para o turno decisivo da eleição presidencial, os dilemas da transição política eram mais evidentes num vilarejo agrícola no delta do Nilo.

Situada 70 km ao norte do Cairo, Kafr el Meselha é a cidade natal de Hosni Mubarak, o ditador derrubado em 2011 por protestos populares após 30 anos no poder.

É quase impossível achar, entre os cerca de 10 mil moradores, alguém que manifeste orgulho por ser conterrâneo de Mubarak. Sua imagem, antes onipresente em escolas e outros espaços públicos, desapareceu.

Mas se o culto à personalidade é coisa do passado, o legado do ex-ditador não está morto: a maioria em Kafr el Meselha diz apoiar Ahmed Shafiq, último premiê de Mubarak e considerado o candidato do antigo regime.

"Nos primeiros anos do governo Mubarak era um orgulho ser da mesma cidade do presidente", conta o professor de inglês Osama Atala, 47. "Depois que se afastou do povo e se meteu em corrupção, virou uma vergonha".

Apesar disso, Atala, como a grande maioria dos eleitores entrevistados pela Folha no vilarejo, disse que daria seu voto para Shafiq.

Alguns, como Atala, por achar que o ex-comandante militar tem a experiência e a autoridade necessárias para restabelecer a estabilidade perdida no último ano.

Outros, simplesmente por rejeitar o caráter religioso do adversário de Shafiq, Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana. "Prefiro o antigo regime que a ditadura dos barbudos", diz o agricultor Ahmed Shoufy, 53.

Para muitos dos jovens que lideraram a revolta contra Mubarak, o dilema será resolvido com o voto nulo.

Nos últimos dias, um número crescente deles abandonou a ideia de votar em Mursi para punir o antigo regime e optou pelo boicote.

Nas primeiras horas de votação ontem no Cairo e em outras partes do país, não havia o mesmo entusiasmo nem as longas filas do primeiro turno, quando o comparecimento foi de 46,4%.

PRIMO

O desânimo aumentou desde quinta, quando a Suprema Corte decretou a dissolução do Parlamento dominado por islamitas. O fechamento foi formalizado ontem pela junta militar que governa o país. A Irmandade pediu um referendo sobre a medida, chamando-a de inconstitucional.

Para ativistas pró-democracia, foi um golpe consolidar seu poder e impedir a transição para a democracia.

"Para que votar se o roteiro está sendo escrito pelos militares?", diz o tradutor Mohamed Kamel, 27. A eleição será concluída hoje.

Além de crucial para o país, no vilarejo de Kafr el Meselha a sucessão de Mubarak é assunto de família.

O primo em segundo grau Mohamed Mubarak, 44, lamenta a "injusta" prisão perpétua imposta ao ex-ditador, afirmando que ele não foi responsável pelas mortes de manifestantes. E não esconde o voto em Shafiq.

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