Índice geral Mundo
Mundo
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Chávez usa fachada democrática para perseguir oposição, diz ONG

Diretor de Human Rights Watch compara venezuelano a Fujimori

DE WASHINGTON
DE SÃO PAULO

A organização pró-direitos humanos Human Rights Watch diz que o venezuelano Hugo Chávez conseguiu construir, em quase 14 anos no poder, um sistema para punir e censurar críticos do governo que funciona sob uma fachada legal democrática.

No duro relatório "Apertando o Cerco: Concentração e Abuso de Poder na Venezuela de Chávez", divulgado ontem em Washington, a ONG critica as manobras legais que ajudaram o governo a controlar a mais alta corte do país e cita casos de como o tribunal é supostamente usado contra adversários.

"O precursor desse modelo de governo na América Latina foi Fujimori [1990-2000], no Peru, que mantinha uma fachada e usava todo o aparato [institucional] para seus propósitos políticos", disse José Miguel Vivanco, diretor da Human Rights Watch para as Américas.

O ativista foi expulso da Venezuela pelo governo em 2008 após a publicação de um relatório da HRW.

EFEITO AFIUNI

O relatório identifica autocensura no Judiciário ou "efeito Afiuni", o temor espraiado entre os juízes após a prisão, em 2009, da juíza María Lourdes Afiuni.

Afiuni deu liberdade condicional a um banqueiro desafeto do governo, foi atacada pelo presidente na TV e detida. Em prisão domiciliar desde 2011, ela se recusa a ser julgada nas atuais condições e ganhou um defensor admirado por Chávez, o linguista americano Noam Chomsky.

"A novidade deste relatório não é a parcialidade dessas instituições, mas sim que, durante anos, tem se construído uma nova marginalidade, redesenhado as instituições com o objetivo de validar as políticas do governo Chávez", disse Vivanco.

"O Supremo abandonou sua função de servir como contrapeso do Executivo [...]. Muitos juízes provavelmente são influenciados pelo caso Afiuni", disse o diretor.

No relatório, juízes venezuelanos comentam o tema. "São decisões exemplificadoras que causaram, além de temor, terror. Já não há só o risco de ver afetado seu cargo, mas também sua liberdade", diz um juiz não identificado.

O "efeito Afiuni" opera em conjunto com um problema de longa data do Judiciário: a profusão de juízes provisórios, de livre remoção, o que aumenta a vulnerabilidade ante superiores e o governo.

NA MÍDIA

O relatório da ONG compila leis de mídia que considera restritivas, cita casos de censura e descreve práticas de pressão continuada contra TVs e rádios -ainda que alvo de punições e censura pontuais, jornais como os nacionais "Tal Cual", "El Nacional" e "El Universal" seguem circulando com severas críticas ao governo e a Chávez.

No caso de TVs e rádios, as multas e a ameaça de não renovação da concessão pelo governo -como ocorreu com a emissora RCTV em 2007- pioram a situação.

A TV opositora Globovisión, por exemplo, foi obrigada a pagar uma multa milionária no mês passado.

Como no Judiciário, o texto diz que punições reverberam estimulando autocensura praticada por empresários de mídia e até pelos jornalistas de TV e rádio.

O jornalista crítico do governo Nelson Bocaranda, que ganhou holofotes por revelar que Chávez tinha câncer antes de o governo confirmar em 2011, também diz ter sido alvo de autocensura praticada pela Venevisión, agora a maior emissora de TV privada da Venezuela.

Em junho, Bocaranda disse à Folha que, por quatro anos, até 2011, recebeu salário pago pela Venevisión sem ir ao ar ou trabalhar. O motivo, disse, era a preocupação da canal com a renovação da concessão, que saiu em maio, só três dias antes de o prazo da atual terminar. A concessão vale por cinco anos. (LUCIANA COELHO E FLÁVIA MARREIRO)

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.