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Governo Morales eleva tom contra Brasil

Bolívia vê pressão de Brasília para conceder salvo-conduto a senador da oposição, há 53 dias na embaixada brasileira

Para o Itamaraty, a situação está em 'ponto morto', mas diálogo para saída do político segue em andamento

DE SÃO PAULO
DE BRASÍLIA

A Bolívia subiu o tom contra o Brasil no caso do senador opositor Roger Pinto, abrigado há 53 dias na embaixada brasileira em La Paz.

A ministra das Comunicações boliviana, Amanda Dávila, acusou o embaixador brasileiro, Marcel Biato, de "ingerência" e de "pressionar" seu governo a conceder um salvo-conduto para que Pinto, que se diz perseguido político, deixe a Bolívia.

Em junho, o Brasil concedeu asilo ao senador, irritando La Paz, e a situação chegou a um impasse cuja solução não parece à vista -Pinto, instalado numa sala sem banheiro da embaixada, ganhou até uma bicicleta ergométrica para se exercitar.

Segundo a Folha apurou com uma autoridade brasileira, o governo Evo Morales já entregou ao brasileiro documento que nega o direito de saída ao político.

Ontem, a ministra disse que um salvo-conduto para o senador, que responde a 20 processos na Justiça boliviana, seria ilegal. "A Constituição diz que não se pode conceder salvo-conduto [...] a uma pessoa que tem processos na Justiça comum."

INGERÊNCIA

O Ministério das Relações Exteriores nega ter recebido da Bolívia uma negativa oficial e considera a situação em "ponto morto". "Não existe evolução ainda. Continua o diálogo entre os dois lados", afirma Tovar Nunes, porta-voz da chancelaria brasileira.

Apesar do impasse, o Brasil não vê margem para recuo. "Por questões legais, jurídicas, não é possível. Do nosso lado, só pode evoluir para abrigá-lo aqui em território nacional", afirma o embaixador. "É uma situação incômoda para o lado boliviano e para o brasileiro. Precisamos lidar com diplomacia."

Foram dois dias de duras declarações da porta-voz de Evo Morales contra o embaixador brasileiro. Anteontem, irritada por declarações de Biato num evento na segunda, a ministra disse que o diplomata teve "atitudes de ingerência" e o comparou a um embaixador americano.

Ávila chegou a dizer que Biato seria "convocado" a dar explicações na Chancelaria boliviana. Ontem, a ministra recuou nesse ponto -"não está decidido que se convoque o embaixador"- e disse que o embaixador estava "um pouco angustiado".

À mídia boliviana Biato tinha afirmado na segunda que esperava "resolver" o tema do senador com o governo e que as relações bilaterais eram "sólidas". O embaixador havia comentado que Pinto tinha ganhado uma "bicicleta [ergométrica] para poder fazer exercício".

O constrangimento envolvendo o senador se junta a uma série de contratempos recentes na relação entre Bolívia e Brasil, um tema que vem ganhando peso na agenda política interna boliviana.

O principal contratempo é a crise por conta do projeto de construção de uma estrada pela brasileira OAS, com financiamento do Brasil.

Protestos de indígenas contra a obra, que cortaria uma reserva, virtualmente a paralisaram. Depois disso, o governo Morales anunciou que rescindiria o contrato com a companhia brasileira, alegando irregularidades. A companhia nega.

O Brasil tem sido acusado por ativistas e opositores à esquerda de Morales de agir de modo "subimperialista" e impor seus interesses a La Paz.

Nesse contexto, a referência de Dávila à "ingerência" e a comparação com a atuação americana não são fortuitas. O Itamaraty atribui parte da forte reação pública boliviana a esse ambiente.

O chanceler Antonio Patriota vem conversando regularmente com o embaixador brasileiro no país sobre o assunto, e a avaliação é que não há estremecimento nas relações bilaterais.

O Itamaraty diz que existe uma "sintonia muito fina" entre os países e não crê que o episódio terá repercussão nas empresas brasileiras instaladas na Bolívia.

(FLÁVIA MARREIRO e FLÁVIA FOREQUE)

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