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Clóvis Rossi

Obama e seu momento Lula-89

Há, no entanto, ao menos três motivos para que Obama não repita nas urnas a derrota do brasileiro

Em muitos momentos do debate com Mitt Romney, o presidente Barack Obama me lembrou o Lula do confronto com Fernando Collor de Mello, em 1989: cabisbaixo, triste, deslocado. Derrotado, enfim, o que é incompreensível (em ambos os casos, aliás).

Se eu tivesse que escrever sobre o debate na própria quarta-feira, não faria essa comparação. Percepções, necessariamente pessoais, são más conselheiras em jornalismo a menos que você possa contrapô-las a outras percepções e, de preferência, a fatos.

Depois de ler os relatos de Luciana Coelho, a análise de Patrícia Campos Mello, meninas de ouro do jornalismo brasileiro, e de ver as pesquisas sobre quem ganhou o debate, atrevo-me agora a lançar a comparação.

Obama estava tão na defensiva que sua melhor ironia foi autodestrutiva: lembrou que dissera, na campanha de 2008, que não era perfeito e que, portanto, não poderia fazer uma Presidência perfeita.

E emendou com algo como "é a única promessa que o governador Romney acha que mantive".

Quando candidatos têm que se mostrar gladiadores imbatíveis, por força da "mercadotecnia" que domina a política, admitir que se é apenas humano é declarar-se perdedor.

Resta ver agora se Obama terá o mesmo destino de Lula, perder o debate e a eleição. Ninguém sabe, mas há alguns fatores que trabalham a favor do democrata, a saber:

1 - Não há nos Estados Unidos uma rede de TV hegemônica que possa fazer uma edição do debate tão desavergonhada como a Globo fez do embate Lula/Collor.

2 - Ainda há dois outros debates pela frente, e parece impossível que o presidente repita sua desastrosa performance. Como a última impressão é a que fica...

3 - Menos de 48 horas depois do debate, Obama festeja o índice de desemprego de setembro, de 7,8%, o menor desde janeiro de 2009, quando ele havia acabado de tomar posse.

Tudo bem que há diferentes maneiras de ler esse dado. Os republicanos, por exemplo, podem lembrar que, se se incluir os que desistiram de procurar trabalho, o desemprego aumentou em vez de diminuir.

Mas, em eleições, conta menos a letra miúda que a manchete, e a manchete é o menor desemprego desde a posse de Obama.

Não li informações sobre as razões do mau desempenho do presidente. Que ele é mau debatedor não me convence. Já o vi sair-se muito bem em meia dúzia de entrevistas coletivas, que não deixam de ser parentes de debates.

Meu palpite: o presidente não fica à vontade ao defender que o Estado, embora não seja a solução para tudo, tem papel essencial na promoção do crescimento econômico e para garantir tratamento justo aos diversos segmentos da população, conforme escreveu Peter Baker para o "New York Times", reproduzido pela Folha.

O americano tem, no geral, uma inclinação para a Estado-fobia que pode ser mortal para um presidente confrontado por um rival que pensa o contrário e basicamente por isso lhe disputa o cargo voto a voto.

Será uma pena se a eleição se decidir não pelo confronto de visões de mundo mas sim pela performance na televisão.

crossi@uol.com.br

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