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Brasileiro é mentor de crítica light de Capriles a presidente

Marqueteiro Renato Pereira cuida da campanha do adversário de Chávez

Responsável também pela propaganda de Eduardo Paes no Rio, ele ressalta sua veia de documentarista

ITALO NOGUEIRA
DO RIO
FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A CARACAS

Fugindo da guerra ideológica de Hugo Chávez e repetindo o modelo pragmático que faz sucesso no Rio, o marqueteiro Renato Pereira, 52, é o brasileiro que ajudou a construir, pela primeira vez em 13 anos, uma ameaça a uma vitória eleitoral do presidente venezuelano.

Ligado ao governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), Pereira repete, na campanha do opositor Henrique Capriles, a internacionalização da comunicação política brasileira, a exemplo de Duda Mendonça e João Santana.

Rejeita, porém, o rótulo de marqueteiro. Ressalta a veia documentarista. E gosta de lembrar a origem como antropólogo indigenista, pesquisador do Parque do Xingu.

Em contato com a equipe de Capriles há quase um ano, Pereira, junto com o jornalista Chico Mendez, 30, preparou a estratégia de campanha. Decidiu fugir das críticas ao modelo político chavista e focou em suas consequências no dia a dia da população.

"Usamos a agenda cotidiana -as questões de segurança, emprego, desenvolvimento. Muito mais do que a discussão ideológica. [Fazer isso] Seria cair na armadilha do Chávez", disse Pereira.

Na Venezuela, repete a estratégia de posicionamento no espectro ideológico usado no Rio. Para ele, o centro político está abandonado na América Latina.

"Há pessoas que fazem comunicação de esquerda e de direita. E o centro, tão importante para a governabilidade, com seus desafios próprios, fica abandonado."

Trotskista na adolescência, antropólogo na juventude e documentarista no começo profissional, Pereira iniciou a carreira no marketing político pelas mãos de Cabral.

Após participar da produção de peças publicitárias com o irmão do governador, Maurício, em 1998, foi convidado a fazer a campanha do então candidato a deputado.

Desde então, segue o peemedebista, que o indicou para candidaturas estratégicas de seu grupo político, como Eduardo Paes (PMDB), favorito na eleição de hoje no Rio de Janeiro.

"No caso da Venezuela, o centro político é revolucionário. O Rio era um lugar que todos transformavam em plataforma para suas pretensões políticas pessoais."

Na Venezuela, a estratégia seguiu o espírito. Capriles usa como slogan "Há um caminho" para um genérico "progresso". Contra o vermelho do chavismo, escolheu as cores pátrias vermelho, amarelo e azul. O candidato veste camisa da seleção de futebol e transformou o boné tricolor em seu símbolo.

Analistas da oposição, que a princípio estranhavam o discurso "quase floral" de Capriles, agora são entusiastas.

"O que fizemos foi organizar a mensagem de Capriles, transformar em narrativa de comunicação. Não estava claro para eles que a ideia de união poderia ser usada", afirma Mendez.

O candidato opositor chegou a articular encontro com Paes e Cabral no Rio para conhecer as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a fim de usar como exemplo para redução das altas taxas de homicídio. O encontro, marcado para abril, foi cancelado.

Especulou-se à época que houvera intervenção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva junto ao governador, já que o petista apoia Chávez. Pereira nega.

"Quando gravamos o depoimento do Lula [para a campanha de Paes em setembro], ele chegou brincando. 'Pô, vai defender o Capriles!'"

Em 2008, Pereira participou da operação montada para atrair Lula para a campanha do segundo turno de Paes. A aliança entre governos federal, estadual e municipal foi considerada um trunfo da candidatura. Na Venezuela, eles estão em lados opostos.

"Não tenho a menor dúvida de que o Lula está muito errado na Venezuela."

DAVI E GOLIAS

Nos filmes de campanha, também repete estratégia que trouxe do Rio. Usa muitos personagens para resumir políticas públicas e qualidades pessoais de seu candidato. Chega inclusive a aproveitar parte da trilha sonora da campanha de Paes nos vídeos de Capriles.

Pereira define a campanha venezuelana como uma briga entre Davi e Golias, em razão do restrito tempo de exposição na TV de Capriles em comparação com o de Chávez (não há horário eleitoral gratuito). A presença do presidente é 20 vezes a do opositor, calcula.

"É piada dizer que há democracia na Venezuela. Há frestas democráticas que a oposição tenta usar."

VOVÔ-GAROTO

O trabalho audiovisual de Pereira começou no fim dos anos 1980, quando ele foi para o Parque do Xingu dar cursos de técnicas de filmagem para índios caiapós, como parte do mestrado não concluído no Museu Nacional da UFRJ. Morou com a mulher e duas filhas por três meses na casa do cacique Raoni, famoso líder da etnia.

Fundou a produtora TVZero, com o cineasta Roberto Berliner, na qual produziu documentários como "A Pessoa É para o que Nasce". Foi via produtora que teve contato com o irmão de Cabral.

Com quatro filhos e dois netos, Pereira é conhecido como "vovô-garoto". Pratica parapente, já viajou boa parte da América Latina de moto e subiu o Everest.

Com estilo informal e despojado, diz que não vai reivindicar o papel principal numa eventual vitória.

"A gente tem um papel relevante, mas secundário. Estamos ajudando um grupo que já tinha estratégia, posicionamento, trajetória a ser talvez um pouco mais eficiente na comunicação visual. Não somos os inventores da mensagem do Capriles."

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