São Paulo, terça-feira, 01 de janeiro de 2008

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Conflito político mata dezenas no Quênia

Opositores se insurgem contra resultado oficial da eleição; ONU e União Européia dizem haver indícios de fraude

Manifestantes e policiais se enfrentam; pelo menos 135 pessoas foram mortas no país, considerado um dos mais estáveis da região

DA REDAÇÃO

Conflitos entre policiais e partidários do candidato oposicionista à Presidência, Raila Odinga, deixaram ontem dezenas de mortos no Quênia, que era considerado um dos países mais estáveis da África Oriental. Os manifestantes, que não aceitam a vitória apertada do presidente Mwai Kibaki e alegam fraudes no pleito -acusação respaldada pela ONU e pela União Européia-, tomaram as ruas da capital armados com pedras e paus, sendo reprimidos a bala por policiais. Agências internacionais contabilizam entre 135 e 185 mortos.
"Passadas as eleições, é agora tempo de cicatrizar feridas e de reconciliação entre os quenianos", disse Kibaki, em mensagem de Ano Novo transmitida ontem em rede nacional, enquanto os conflitos tomavam o país e o número de corpos espalhados pelas ruas aumentava. O governo proibiu transmissões ao vivo de televisão, mas afirmou que não pretende declarar estado de emergência.
Casas e estabelecimentos comerciais dos kikuyus, grupo étnico ao qual pertence Kibaki e no qual se concentram seus eleitores, estão sendo depredados por manifestantes nos Províncias do oeste do país, segundo relatos da Cruz Vermelha. Odinga é um luo e conta com apoio quase irrestrito no seu clã, concentrado na região ocidental do Quênia.
As conflitos marcam o fim de um período de grande otimismo, iniciado com a vitória, em 2002, da Coalizão Nacional do Arco-Íris, liderada por Kibaki. A chamada "revolução de veludo", que pôs fim a 24 do governo de Daniel Arap Moi, foi um marco da abertura política no Quênia. O Kanu, partido ligado a grupos independentistas, estava no poder desde o fim da ocupação colonial, em 1963.
A base governista logo se esfacelaria em meio a disputas pela divisão do poder. Sem deixar oficialmente o governo, parte dos ex-aliados passou a fazer oposição aberta a Kibaki, sob a liderança de Odinga.
Em 2005, a derrota do governo no referendo de reforma constitucional, que fortaleceria o poder da Presidência, demonstrou a força dos opositores, reunidos no Movimento Democrático Laranja -fruta que representava o "não" nas cédulas do referendo.
Foi a ruptura definitiva. Oriundo do Kanu, partido único no Quênia até 1992, o presidente aliou-se então ao partido que derrotara e demitiu os políticos da nova oposição que tinham cargos no governo.
A recuperação econômica do Quênia -que saiu de anos de recessão, alcançando um crescimento médio que beira os 6% nos últimos quatro anos- contribuiu para a relativa estabilidade do país durante a ruptura. O estabelecimento do ensino primário universal é o outro grande trunfo de Kibaki, que promete estender a política ao ensino secundário. Escândalos de corrupção e acusações de favorecimento aos kikuyus, porém, minam sua credibilidade entre muitos quenianos.

Fraude
O representante da ONU em Nairóbi expressou ontem preocupação com "sérios problemas na contagem dos votos". Em pelo menos um distrito queniano, houve irregularidade comprovada, com o número de votos excedendo em 15% o total de eleitores, segundo a comissão eleitoral do país.
Observadores da União Européia dizem ter sido barrados de centros de apuração de votos na Província Central, uma das zonas onde o governo venceu. Alexander Lambsdorff, chefe da delegação da UE, disse à rede britânica BBC que os resultados anunciados pela comissão eleitoral em Nairóbi diferem dos divulgados localmente. Ele diz ter visto formulários adulterados de votação.
Ontem à tarde, os EUA -que haviam parabenizado Kibaki pela vitória- recuaram e manifestaram dúvidas sobre a lisura do pleito. O país é aliado da Casa Branca no combate a radicais islâmicos na região.


Com agências internacionais

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