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Estatização marca 10 anos de Chávez
Presidente, como os seus antecessores, não conseguiu reduzir dependência da produção petrolífera
Presença do Estado inclui varejo de alimentos; queda expressiva da pobreza pode ser ameaçada por inflação e preço do petróleo em baixa
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
Dez anos atrás, com o barril
do petróleo abaixo dos US$ 10,
o recém-empossado presidente
Hugo Chávez não falava em socialismo. Cauteloso, nomeou
para o Ministério das Finanças
Maritza Izaguirre, que já havia
ocupado o mesmo cargo no governo anterior, do "neoliberal"
Rafael Caldera. E, num gesto
inimaginável hoje, participou
da abertura de uma sessão da
Bolsa de Nova York.
Amanhã, quando Chávez
completará uma década como
presidente, a economia venezuelana, ainda dependente do
petróleo, agora tem uma presença muito maior do Estado,
abarcando da comercialização
de alimentos no varejo a fábricas de cimento.
"No começo, Chávez não tinha escolha", diz o economista
americano Mark Weibrost, codiretor do Centro para Pesquisa em Economia e Políticas Públicas, de Washington. "Ele não
poderia cumprir nenhuma promessa de campanha sem antes
controlar a PDVSA. Os que
controlavam a empresa tentaram derrubá-lo várias vezes."
As mudanças na política econômica para o rumo adotado
hoje foram sentidas de forma
mais clara a partir de novembro de 2001, quando Chávez
promulgou um pacote de leis
que incluía o controle acionário
estatal das operações petrolíferas. O pacote abriu o período
mais crítico da era Chávez,
quando a maior parte da oposição buscou derrubá-lo do governo com um frustrado golpe
de Estado, em abril de 2002, e
uma greve petroleira, entre o
fim de 2002 e o início de 2003.
Aos poucos, Chávez recuperou terreno. Após a greve, cerca
de 20 mil funcionários da
PDVSA foram demitidos e
substituídos por pessoas leais
ao governo. Em 2004, ele venceu o referendo convocado pela
oposição para revogar seu mandato. Foi a época da expansão
das chamadas "missões", programas sociais que, financiados
pelo preço ascendente do petróleo, foram responsáveis pela
diminuição da pobreza de
50,5%, em 1998, para 33,4%,
dez anos depois.
Em dezembro de 2006, após
ser reeleito presidente e com o
petróleo em disparada, Chávez
começou um amplo programa
de estatização. Assumiu o controle da eletricidade, da maior
empresa de telecomunicações,
da indústria cimenteira e da
maior siderúgica do país.
O governo também cria empresas. Subsidiária da PDVSA,
a PDVAL (Produtora e Distribuidora Venezuela de Alimentos) foi lançada há cerca de um
ano, quando o país sofria com
longas filas para comprar produtos como leite e açúcar.
Atualmente, mantém cerca de
1.200 pontos de venda em todo
o país. Os alimentos, vendidos
de forma racionada, são mais
baratos do que nos mercados
privados, e quase tudo que se
comercializa vem do exterior,
principalmente do Brasil.
Câmbio e especulação
Outro pilar da política econômica de Chávez é o controle de
câmbio, adotado desde fevereiro de 2003 para evitar a fuga de
divisas. Atualmente, enquanto
a taxa oficial fixa US$ 1 em 2,15
bolívares, no paralelo o dólar
fechou a semana passada em
5,70 -diferença de 165%.
O enorme desequilíbrio entre o câmbio oficial e o das ruas
tem gerado vários tipos de esquemas para ganhar dinheiro
com a conversão. Um dos mais
conhecidos era viajar ao exterior com cartões de crédito de
"laranjas" -atualmente, cada
pessoa tem direito a US$ 2.500
anuais pelo câmbio oficial-, retirar dólares em caixas automáticas e revendê-los no país.
"É incrível a magnitude de
especulação que gera um projeto socialista", afirma o economista Orlando Ochoa, crítico
da política econômica. "O governo Chávez comete o típico
erro latino-americano: fazer
pouco caso da macroeconomia
para, em tempos de crise, correr o risco de perder tudo o que
se conseguiu avançar em combate à pobreza."
Ochoa prevê uma contração
de 2% a 2,5% no PIB venezuelano deste ano. "Os preços do petróleo foram usados para esconder os erros econômicos.
Com a queda, o desequilíbrio
econômico reduzirá o benefício
dos programas sociais."
Em estudo divulgado na semana passada, o grupo de economistas opositores do qual
Ochoa faz parte advertiu que a
recente transferência de US$
12 bilhões dos US$ 43 bilhões
de reservas do Banco Central
para um fundo administrado
por Chávez aumenta a vulnerabilidade externa e a pressão inflacionária. A Venezuela já é o
país com a maior inflação da região - 30% no ano passado.
Com uma opinião mais favorál a Chávez, Weisbrot também
critica a política de câmbio,
apontada por ele como um dos
problemas empecilhos a que a
economia venezuelana se desvencilhe do petróleo. O economista americano, no entanto,
vê a Venezuela numa situação
muito mais confortável do que
a de outros países.
"As reservas estão acima do
25% do PIB. Não há emergência, não há nenhum tipo de colapso iminente como ocorreu
com a Argentina, em 2001, ou
com os EUA, no ano passado."
Segundo Weisbrot, a economia ainda pode aguentar por
até dois anos um cenário de petróleo barato. "E nenhum especialista está prevendo que o
preço do barril continue tão
baixo para sempre", diz.
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