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São Paulo, sábado, 01 de março de 2003

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Paris vê "descompasso" americano

JOAQUÍN PRIETO
DO "EL PAÍS", EM PARIS

O ministro francês das Relações Exteriores, Dominique de Villepin, lançou um apelo ao direito e à moral que devem presidir as relações internacionais para impedir que a ONU se veja sem outra opção senão "avalizar uma guerra precipitada por meio de uma nova resolução, como a que acaba de ser proposta pelo Reino Unido, Estados Unidos e Espanha".
Em entrevista, De Villepin argumentou contra a legitimidade de uma intervenção militar realizada antes que as inspeções de armas tenham rendido fruto.
 

Pergunta - Até que ponto o sr. acha decisiva a destruição dos mísseis Al Samoud, prometida pelo Iraque?
Dominique de Villepin -
É uma etapa importante, porque se situa na lógica da aplicação correta da resolução 1441. Os especialistas precisam ter a oportunidade de dizer, programa por programa (nuclear, químico, bacteriológico e balístico), o que é preciso fazer, determinando os prazos.
A questão dos mísseis é exemplar: obtivemos informações através dos iraquianos e pudemos verificar essas informações. Agora ingressamos na terceira fase, que é a eliminação dos mísseis. A França quer converter essas inspeções num instrumento que possa ser utilizado realmente para resolver pacificamente outras crises ligadas à proliferação de armas. Se nos precipitarmos e usarmos a força militar, a tentação de recorrer à força imediatamente será grande também em outras crises. Ainda não estamos num beco sem saída.

Pergunta - Mas e se Saddam se negasse a destruir os mísseis?
De Villepin -
Nosso objetivo é o desarmamento pacífico do Iraque. Se isso não for conseguido, então poderão ser estudadas todas as outras saídas possíveis, entre elas a da força. Mas a precipitação me parece inoportuna. Seria paradoxal que uma resolução abrisse as portas para a guerra quando as inspeções estão dando resultados. A legitimidade conferida pelo direito internacional é fundamental. O calendário militar norte-americano está fora de compasso com o calendário da comunidade internacional.

Pergunta - O sr. vê alguma possibilidade para a via multilateral?
De Villepin -
Existe na ONU uma maioria clara a favor da via pacífica. O Conselho de Segurança deve velar pelo respeito à resolução 1441 e continuar seus esforços para encontrar uma solução pacífica para a crise. A questão é saber se a ONU se aterá a essa resolução ou se ela não tem outra opção senão a de legitimar uma decisão precipitada de intervenção militar. Não é justamente isso que pode afetar a autoridade da ONU?

Pergunta - Há quem pense que a posição da França também é inspirada por interesses econômicos.
De Villepin -
Conheço esses argumentos. Vamos falar a sério: o Iraque é apenas o 53º parceiro comercial da França.

Pergunta - A impressão que se tem é que a França suavizou sua postura em relação ao veto. Muitos temem as tensões nas relações entre a França e os EUA.
De Villepin -
A posição francesa está muito clara. É uma questão de responsabilidade. A França quer conservar toda sua liberdade de ação e opinião. Pode haver nuanças, mas não existem divergências de fundo nas posições da maioria. Trata-se da visão que temos sobre a organização do mundo: somos a favor de uma ordem mundial multipolar, fundamentada no direito e na moral e centrada no princípio da responsabilidade coletiva.


Tradução de Clara Allain


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