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EM BAGDÁ
Chanceler iraquiano lembra guerras do período colonial e promete a morte aos invasores
"Britânicos já têm túmulos no Iraque"
ROBERT FISK
DO "THE INDEPENDENT", EM BAGDÁ
Ao cair da noite na segunda-feira, o chão em torno do cemitério
de guerra do Portão Norte de Bagdá tremia com a vibração das
bombas. O céu, cinzento com a
fumaça do petróleo, estava salpicado de clarões causados pelos
disparos da artilharia antiaérea.
E, por sob as nuvens de fumaça
e as explosões distantes e luminosas dos projéteis de artilharia, o
sargento Frederick William Price,
da Real Artilharia, o cabo A. D.
Adsetts, do Regimento de York e
Lancaster, e o aviador de primeira
classe P. Magee, da Real Força Aérea, continuavam adormecidos.
Um lugar assustador para visitar,
talvez, enquanto os primeiros ataques aéreos noturnos atingiam a
capital na noite de ontem.
Nem tanto. Pois o ministro do
Exterior do Iraque, Naji Sabri, falou desses túmulos ontem e despertou os fantasmas de passados
colonizadores. Pois o sargento
Price, o cabo Adsetts e o aviador
Magee morreram todos durante a
primeira guerra colonial britânica
no Iraque, em 1921.
E o que foi mesmo que Sabri
disse, vestido em seu uniforme do
partido Baath, algumas horas antes? "Soldados britânicos já têm
túmulos no Iraque, dos anos 20 e
de 1941... Agora, terão novas sepulturas, nas quais receberão a
companhia de seus amigos, os
norte-americanos".
É verdade que há túmulos britânicos por todo o Iraque. Entre os
mais tristes estão os de Kut-el-Amara -cidade já bombardeada
pelos norte-americanos e britânicos, mas ainda não ocupada-,
onde os mortos do grande e terrível sítio otomano da Primeira
Guerra Mundial jazem entre os
esgotos abarrotados da imunda
cidade. Há milhares deles no Portão Norte, em Bagdá, na velha estrada para Mossul. O soldado Nicholson, do regimento de York e
Lancaster, só tinha 23 anos quando morreu, em 12 de agosto de
1921, e o soldado Clark, do Real
Corpo de Serviços do Exército, tinha 38 ao morrer, seis dias depois.
A primeira guerra de guerrilhas
opondo nacionalistas iraquianos
e invasores será revivida agora, de
acordo com o partido Baath. "Vamos transformar o nosso deserto
em um grande cemitério para os
soldados norte-americanos e britânicos", disse Sabri. "As forças
norte-americanas e britânicas que
não se renderem enfrentarão a
morte no deserto, ou terão de correr de volta para a proteção de seu
regime títere no Kuait".
Enquanto mísseis cruzavam os
céus de Bagdá em todas as direções ontem, um deles passou a
apenas 60 metros de altura sobre
o rio Tigre, explodindo contra um
palácio presidencial, a temperatura da linguagem empregada esquentava proporcionalmente. Os
novos colonizadores, segundo o
chanceler, estavam usando a velha "regra de ouro" britânica do
"dividir para conquistar" -esqueçamos por um momento que
"divide et impera" é originalmente uma regra romana-, e jamais
conseguiriam romper a unidade
do povo iraquiano.
Do ministro da Informação,
Mohamed Said al-Sahaf, surgiram alegações de que o moderno
Exército britânico acabara de destruir uma usina de purificação de
água em Basra, capaz de fornecer
água para 1,3 milhão de pessoas, e
que esse exército estava agora
ocupado em trazer ao Iraque
"água mineral do Reino Unido".
Um armazém foi destruído na
cidade, disse ele, no qual 75 mil
toneladas de alimentos estavam
armazenados. Não há maneira de
verificar essas alegações. E nenhuma, evidentemente, de confirmar
as demais afirmações que ele fez
nas últimas 36 horas, sobre a destruição de tanques, transportes de
pessoal, helicópteros Apache e
aviões de reconhecimento não-tripulados americanos.
As declarações soavam como se
o Iraque acreditasse merecer ter
destruído todo esse equipamento.
Mas, com a televisão iraquiana
mostrando imagens reais em vídeo de um tanque norte-americano Abrams e pelos menos dois
transportes blindados de pessoal
queimando -e com o comando
anglo-americano no Qatar sofrendo de seu habitual laconismo-, quem pode dizer quantas
baixas cada lado vem sofrendo?
Os EUA falam em centenas de
mortos iraquianos, e o Iraque diz
ter matado 43 soldados britânicos
e americanos em combate.
Até que ponto essa retórica seria
abandonada, de qualquer forma,
se houvesse maneira de escapar à
guerra? "A verdadeira diplomacia", anunciou Sahaf, "é matar os
norte-americanos e britânicos no
campo de batalha, para que sintam que seus sonhos não serão
realizados. Não permitiremos que
esses lacaios imundos se mantenham na terra do Iraque".
Lacaios? A expressão não costumava ser "lacaios e cães mandados" quando a União Soviética
existia? Estamos mesmo voltando
ao colonialismo? Já que os americanos não recuaram ainda de sua
promessa de ocupação e governo
militar, não é fácil evitar a questão. E nem é difícil imaginar o que
o aviador Magee poderia pensar
enquanto seu túmulo vibra sob as
explosões de bombas lançadas
pela mesma Real Força Aérea sob
as ordens da qual ele morreu tanto tempo atrás no Iraque.
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