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Argentina endurece no aniversário das Malvinas
Kirchner politiza os 25 anos da guerra, enquanto Londres mostra desinteresse
Nenhum membro da família real inglesa participará das celebrações pela vitória de 1982, que selou o destino da ditadura militar argentina
BRUNO LIMA
DE BUENOS AIRES
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DE LONDRES
"Máximas de hoje para todo
o país: Ilhas Malvinas, 7ºC. Mínima: 5ºC." A informação é da
TV Argentina e está lá todos os
dias, várias vezes por dia. Não
importa o canal -as ilhas estão
em todos eles. Nos jornais, a
mesma história. Só o que muda
é a temperatura.
Um quarto de século após a
Guerra das Malvinas e 174 anos
depois de perder o domínio sobre as ilhas, a Argentina segue
vivendo como se as Malvinas
fossem ainda parte do país.
"Elas são parte do país. Só que
estão tomadas pelos ingleses",
diz o ex-soldado e jornalista argentino Edgardo Esteban, autor de um livro sobre a guerra.
O que mudou, neste ano, foi a
temperatura política. Com eleição para a Casa Rosada em outubro e com a efeméride dos 25
anos do combate (iniciado em 2
de abril de 1982 e finalizado,
com a vitória inglesa, em 14 de
junho daquele ano), o presidente argentino, Néstor Kirchner, endureceu sua posição e
cancelou um acordo de cooperação com o Reino Unido.
Abandonando o furor argentino e atravessando o Atlântico,
é possível descobrir, nas ruas
de Londres, um rarefeito interesse pelo mesmo arquipélago.
Perdidas em meio a tantos
territórios britânicos, as ilhas
Falkland, como o Reino Unido
as chama, nem mesmo são um
ponto turístico badalado como
é Bermudas ou Ilhas Virgens.
O desinteresse, porém, não
tem resquício de culpa imperialista: a maioria da população
não tem dúvidas de que a guerra foi necessária e de que o Reino Unido estava correto.
Na semana passada, em entrevista ao seu site oficial, o
premiê Tony Blair afirmou que
a decisão de Margaret Thatcher
de enviar forças militares às
ilhas, após sua tomada pelos argentinos em abril de 1982, exigiu "muita coragem política" e
que ele teria feito o mesmo.
"Quando olho para trás, não
tenho dúvida de que foi a coisa
certa a fazer", disse Blair, o único premiê britânico a visitar a
Argentina desde o conflito. A
declaração, que irritou a Casa
Rosada, não causaram tanta espécie em terras inglesas.
Conflito "tolo"
Um dos poucos britânicos
críticos da guerra, o jornalista
Max Hastings, autor de dois livros sobre o tema, afirma que,
ainda que na época a ação tenha
parecido sensata, ele diz ver hoje o conflito como algo "tolo".
"A única lição da guerra foi
que o sucesso justifica tudo. Se
Thatcher tivesse perdido, seu
governo teria caído", disse Hastings no jornal britânico "The
Guardian". "Se o Iraque fosse
hoje pacífico, ninguém estaria
ligando para a ausência das armas de destruição em massa."
Na Argentina, o ditador Leopoldo Galtieri (1926-2003) de
fato deixou o poder com o fracasso na guerra. O objetivo era
dar sobrevida à ditadura, mas a
democracia veio em 1983.
"Foi um gesto egoísta, vil, da
Junta Militar, que não considerou a questão das Malvinas em
si, mas a possibilidade de perpetuar-se no poder", diz Ernesto Alonso, 44, que foi à guerra
aos 18 anos e milita em um centro de ex-combatentes.
Para Thatcher, ao contrário,
a guerra pôde de reverter uma
crise de popularidade. O episódio vai virar filme, segundo
anúncio das produtoras Pathé
(que fez "A Rainha", de Stephen Frears) e BBC.
A Constituição argentina estabelece as Malvinas como "um
objetivo permanente e irrenunciável do povo argentino".
A Argentina reclama que o
Reino Unido ignora as recomendações da ONU e se recusa
ao diálogo. O Reino Unido diz
que não dialoga até que os moradores da ilha -a maioria descendente de britânicos- decidam seu futuro.
"É claro que eles não vão optar pela Argentina. São britânicos. Estão ali porque os ingleses
expulsaram os argentinos", diz
o deputado argentino Jorge Argüello, que preside o Observatório Parlamentar Questão
Malvinas.
O deputado, governista, também critica os festejos planejados pelos britânicos para o 14
de junho. "A Grã-Bretanha está
tentando tapar, com um sucesso de 25 anos atrás, um fracasso
de agora no Iraque", declarou.
De acordo com Derek Twigg,
representante dos veteranos
no Ministério da Defesa inglês,
as celebrações "não serão
triunfantes". "Vamos reconhecer as perdas dos argentinos
também", disse. Nenhum representante sênior da pasta ou
da família real irá às ilhas, decisão que irritou os veteranos ingleses, sobretudo porque o
príncipe Andrew, irmão de
Charles, esteve na guerra.
A celebração oficial britânica
-que coincide com a festa pelo
aniversário oficial da rainha,
em 16 de junho-, durará quatro dias, na Inglaterra e nas
ilhas, com desfiles de veteranos
e da cavalaria, e transmissões
simultâneas de eventos entre
Londres e as Falklands.
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