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Artistas se dividem ao retratar o controvertido Sarkozy
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS
Os desenhistas franceses René Pétillon e Riss concordam
que o desenho político é um
universo à parte, onde toda
eleição é especial. Mas um mesmo elemento une qualquer
pleito: a dramaturgia própria.
Desenhista de um livro sobre
o candidato da direita à Presidência da França, Nicolas Sarkozy, Riss diz: "Sim, a política
tem uma "mise en scene" especial e é isso que permite que ela
vire quadrinho" -enquanto
confessa um certo tédio para
traçar "Sarkô", um homem que,
segundo ele, "faz sempre o
mesmo número".
Depois de um ano desenhando o personagem, Riss diz não
agüentar mais vê-lo, o que soa
como metáfora das posições
tanto dele como de Pétillon para as próximas eleições francesas -os dois conversaram sobre o tema a convite da Folha.
Pétillon "gosta" de Sarkozy
por motivos diferentes: "É um
ótimo personagem de apoio
para Chirac e [o primeiro-ministro] Villepin. Ele me inspira.
Eu adoro desenhar Chirac. É
um personagem formidável."
Pois bem, o atual presidente
da França aparece de maneiras
bastante diferentes nos desenhos dos dois. Pétillon o faz
malemolente, curvilíneo, com
seu marcante nariz alongado
como o de um Pinochio. Já Riss
traça a mesma protuberância
de forma aquilina, pontiaguda.
Uma explicação seria técnica: cartum "feito com traços
mais simples, despojados", como explica o cartunista é muito
diferente de quadrinho "que
exige uma preocupação com a
narração, a atmosfera", como
diz o quadrinista. Apesar das
diferenças, um mesmo movimento os une os desenhistas: a
indignação, sem militância.
"Em geral, aquilo que me inspira é o que me enerva. É uma
dramatização da minha reação.
É para ser engraçado, mas tem
que passar pela ironia", diz Pétillon. "É o interesse pela política que move o desenho, mas
não se pode ser militante. O objetivo não é lutar contra ou a favor de nada", completa Riss.
Na França, a charge política
não é tão publicada quanto no
Brasil. Os dois desenhistas lamentam que o desenho político seja relegado mais aos jornais satíricos. Desconhecedores da vida política e jornalística brasileira, dizem que seria
difícil emplacar um gibi com
um personagem como Lula.
"Provavelmente, o único líder latino-americano que poderia interessar aos franceses
seria Fidel Castro", diz Pétillon. "Poucos líderes do mundo
interessariam, aliás. Mas talvez
George Bush", completa Riss,
com a expressão de quem começa a maquinar alguma coisa.
A pergunta de Sarkô
O livro "La face karchée de
Sarkozy", no qual o candidato é
traçado por Riss, ocupa lugar
especial na galeria da reinvenção da política pelo desenho.
Mais do que uma compilação
de piadas, o álbum de 150 páginas é uma pesquisa jornalística
extensa, com bibliografia, fac-símiles de documentos, reconstituição de fatos etc.
A diferença em relação a biografias habituais é o formato: a
saga de Sarkozy é contada como história em quadrinhos.
Com balões e tudo. E a partir de
uma inusitada e fictícia pesquisa de doutorado apresentada
na Sorbonne em 2098!
Nasceu de uma pergunta que
intrigava o jornalista francês
Philippe Cohen em 2004,
quando ele começou a pesquisa, que durou um ano e meio.
"Naquele momento, Sarkozy
ocupava todos os horizontes da
política francesa e não havia
dúvida de que ele seria presidente agora. E como é definitivamente um personagem que
não convém ao país, eu queria
entender porque todo mundo o
achava indestrutível", diz Cohen, 53, com passagens por veículos importantes em seu país.
Para Cohen, a resposta para a
pergunta é a mesma aplicável
àquela sobre a opção dele e de
Richard Malka, advogado do
"Charlie-Hebdo", semanário
em que trabalha Riss, por fazer
uma "bande dessinée": a conversão dos atores políticos contemporâneos em... atores.
"Sarkozy não acredita na
França, não crê em nenhuma
idéia de fato, é cínico. Seu traço
ideológico mais forte é se converter em personagem, interpretar um papel midiático", diz.
O candidato de direita, entretanto, para ele, não está sozinho. Ele e a socialista Ségolène
Royal, são ambos ótimos para
os quadrinhos, ou seja, operam
segundo a mesma mecânica:
"Sou ligado a uma forma tradicional de política, do debate
de idéias. E os dois fundam a
política em suas próprias personalidades", afirma. "No caso
de Ségolène, o fato de ela colocar um vestido branco ou um
vestido vermelho se tornou
mais importante do que sua
mensagem."
(ALEXANDRE WERNECK)
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