São Paulo, terça-feira, 01 de abril de 2008

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Cuba elimina o "apartheid turístico"

Decisão de permitir aos cubanos o acesso a hotéis e serviços do turismo na ilha se segue a outras medidas liberalizantes

Veto era razão de queixas; pagamento, entretanto, terá que ser feito em "pesos conversíveis", moeda que vale mais que o dólar

Efe
Hotel Nacional, um dos mais tradicionais de Havana


DA REDAÇÃO

Cuba amanheceu ontem com a notícia, espalhada no boca a boca, de que uma das proibições mais impopulares do regime comunista da ilha -o veto para que cubanos se hospedassem em hotéis e alugassem carros, o chamado "apartheid turístico"- havia caído.
Não houve anúncio nem publicação na imprensa estatal. De madrugada, gerentes de grandes redes estrangeiras que operam em Cuba e no centro histórico de Havana foram informados das novas regras, das quais se falava há dias. Os funcionários do setor ainda esperavam uma reunião com o governo para saber detalhes.
Agora, pagando em pesos conversíveis (moeda turística equivalente a US$ 1,08), os cubanos poderão voltar a alugar carros e se hospedar nos hotéis cubanos -o setor, o principal da economia cubana, se expandiu na década de 90 e gera mais de US$ 2 bilhões, apesar de queda de visitação recentemente.
"Vou começar a guardar dinheiro agora mesmo para ir a Varadero no próximo verão", disse Martín Díaz, 34, comemorando o fim da restrição que vigorava desde 1993, no chamado Período Especial, quando da grave crise pós-colapso da União Soviética.
A justificativa oficial era dupla: havia pouca disponibilidade hoteleira e o país precisava atrair divisas; por outro lado, o governo não queria incentivar a desigualdade no país.
A mudança de ontem faz parte de um pacote de medidas liberalizantes recentes do irmão de Fidel, Raúl Castro, que assumiu em fevereiro prometendo eliminar "o excesso de proibições" na vida da ilha.
A despeito dos argumentos anteriores sobre desigualdade, todas as medidas tem em comum o fato de beneficiarem principalmente a parcela da população --calculada em 60%- que tem acesso a alguma quantidade de moeda turística por conta do turismo ou do recebimento de remessas.
Hoje, lojas cubanas começarão a vender em pesos conversíveis computadores e DVDs, além de bicicletas elétricas.
Na próximo dia 14, será a vez da venda de celulares a cubanos, o que também era restrito até sexta-feira passada. Cada linha custará 111 pesos conversíveis (US$ 119,88) -ou sete meses do salário médio de um cubano, equivalente a US$ 17.
O governo anunciou, na edição de ontem do jornal oficial "Granma", que se venderá celulares também em pesos, que vale 24 vezes menos, mas já anunciou que o serviço "gradual e limitado" dependerá do caixa obtido com a venda na moeda mais forte e terá um cadastro semelhante ao usado na lentíssima distribuição atual de linhas fixas.

Novos ricos e economia
Apesar de distante do cotidiano da maioria e sem nenhuma sinalização de abertura política, analistas concordam que o pacote de Raúl, e em especial, o fim do "apartheid turístico", funciona como resposta às milhares de queixas apresentadas pela população em debates convocados pelo próprio irmão de Fidel, no ano passado.
No mais famoso desses debates, que acabou circulando pela internet em janeiro, universitários de Havana cobraram o fim da moeda dupla e a liberdade para viajar ao exterior -especula-se que essa poderia ser a próxima mudança.
Um economista da ilha, que não quis se identificar, vê na série de medidas uma tentativa de fortalecer o peso: "O governo está reconhecendo que cerca de 15% da população mantém 90% dos pesos no banco. É uma tentativa de levar os "novos ricos" -de fazendeiros a contrabandistas- a trocar seus pesos por pesos conversíveis para consumir, dessa forma reduzindo os pesos em circulação e fortalecendo a moeda", disse ele à agência Reuters.


Com agências internacionais


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