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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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CRISE EM CUBA

Em entrevista a jornalistas argentinos, ditador cubano justifica repressão e acusa "alguns nos EUA" de quererem causar um conflito

"Fomos obrigados", diz Fidel sobre execuções

DO "CLARÍN"

Criticado internacionalmente pela execução, no dia 11 de abril, de três homens acusados de sequestrar, uma semana antes, um barco de passageiros com o qual pretendiam fugir de Cuba para os EUA, o ditador Fidel Castro diz que elas foram legais, mas reconhece que trouxeram "um custo".
"Fomos obrigados a tomar medidas. Medidas legais, por meio de julgamentos, não de execuções extrajudiciais", afirmou Fidel em entrevista concedida na semana passada, em Buenos Aires, aos jornalistas Ricardo Kirchbaum, Oscar Raúl Cardoso, Eduardo Van Der Kooy e Julio Blank, do diário argentino "Clarín".
O ditador acusa os EUA de incitarem ações como aquela. "Há pessoas ali que querem provocar um conflito entre EUA e Cuba e querem que o problema de Cuba se resolva da mesma forma que o que aconteceu em Bagdá", disse.

Pergunta - Como a descrição que o sr. faz da Revolução Cubana condiz com a recente execução de dissidentes em Cuba, que teve repercussão tão grande?
Fidel Castro -
Fomos obrigados a tomar medidas. Medidas que eram legais, tomadas por meio de julgamentos, não de execuções extrajudiciais. E o fizemos com muita dor. Estamos cientes do custo, mas foi preciso escolher entre uma manobra que estão fazendo para criar um conflito, porque há pessoas ali -algumas mais do que outras- que querem provocar um conflito entre EUA e Cuba e querem que o problema de Cuba se resolva da mesma forma que o que aconteceu em Bagdá -que dezenas de milhares de bombas caiam de aviões em cima de Cuba.
[Nesse momento, o chanceler cubano, Felipe Pérez Roque, que está na sala, alerta Fidel: "Ele disse "execução de dissidentes'".]
Ah, caramba, não me dei conta. Obrigado, Felipe. Essa é uma das coisas infelizes. São duas coisas totalmente diferentes. Os que assaltaram barcos e aviões não têm absolutamente nada a ver com o problema dos chamados "dissidentes" -e deixo essa palavra entre aspas.
Outro elemento: a provocação foi planejada. Nomearam como vice-secretário para a América Latina um senhor que é um gângster total, Roger Noriega. Ele é um dos muitos sócios da máfia cubano-americana, extremistas, que, ademais, para o azar de todo o mundo, incluindo vocês, foram produtos de uma fraude eleitoral. Não posso explicar como nos EUA se pode falar de democracia -o mundo todo sabe exatamente os votos que foram roubados, o truque de mudar de ordem, os negros que não votaram simplesmente porque não os deixaram ir à escola, sabe que roubaram dezenas de milhares de votos dos democratas, embora a disputa estivesse bem apertada.

Pergunta - Os EUA não podem se envolver nos assuntos internos de outro país, mas Cuba pode?
Fidel -
Ah, mas existe uma diferença. Isso [as críticas] não é sobre um país, mas sobre um governo. Tenho muito respeito pelo povo norte-americano. Um respeito sincero. E estou disposto a responder ao que vocês quiserem sobre esse assunto das execuções. Nesse assunto misturou-se o problema dos chamados dissidentes com o fato estranho, muito estranho, de que, em dez anos, não havia ocorrido um único sequestro de barcos ou aviões com reféns, com a faca na garganta deles, como aquele que fizeram com os aviões lançados contra as torres gêmeas em Nova York ou contra o Pentágono.
Realmente foi preciso tomar a decisão. Um país com uma belicosidade tremenda, como os EUA, enviou um representante [James Cason, chefe da seção de interesses americanos em Havana] com a missão específica de provocar incidentes ou para que o expulsassem para desbaratar um movimento contra o embargo e contra a proibição de viagens, movimento cada vez mais forte nos EUA.


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