São Paulo, sábado, 01 de agosto de 2009

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Raúl adia reunião partidária crucial para futuro de Cuba

Dirigente diz que Congresso do PC pode ser o último com "históricos" no comando

Havana não dá nova data para encontro; Parlamento tem reunião semestral hoje e pode anunciar medidas restritivas por causa da crise


DA REPORTAGEM LOCAL

O líder máximo de Cuba, Raúl Castro, adiou indefinidamente a realização do Congresso do Partido Comunista, previsto para 2009 e que seria o primeiro em 12 anos. Argumentou que é preciso preparar a legenda porque provavelmente, "pelas leis da vida", será o último encontro comandado pelos líderes históricos da Revolução de 1959, a maioria com mais de 70 anos.
O anúncio de Raúl, 78, foi publicado ontem nos jornais oficiais após reunião do Comitê Central do partido. O Congresso do PC era amplamente esperado porque Raúl prometera que lá seriam debatidas "mudanças estruturais e de conceito" no regime comunista.
O dirigente máximo disse que "coisas muito sérias" estão sendo analisadas sobre a economia. Defendeu debate "com divergências saudáveis" e disse que será preciso decidir as diretrizes do futuro pós-irmãos Castro com a população.

Fórmulas novas
A maior crise econômica desde o fim da União Soviética também foi tratada na reunião do Comitê Central, diretório do PC, com 113 membros.
O governo rebaixou de 2,5% para 1,7% a estimativa de crescimento do PIB para 2009, mas estudos independentes preveem números muito piores. Sem acesso a instituições de crédito por causa do embargo dos EUA e com déficit comercial na casa dos 70%, Cuba atrasa pagamentos de fornecedores, raciona energia e comida.
E Havana prevê um 2010 "igualmente difícil". No texto de ontem, Raúl pede compreensão com as medidas restritivas "difíceis, nada gratas, mas simplesmente inadiáveis". O Parlamento cubano faz hoje a primeira de suas duas reuniões anuais e espera-se que sejam impostas ainda mais restrições.
Não se descarta mudanças na economia. Na reunião, Marino Murillo Jorge, ministro da Economia, pregou a descentralização para setores geradores de divisa e a "busca de fórmulas novas" para estimular a produção. Nesta semana, o principal comentarista econômico de Cuba, Ariel Terrero, sugeriu que o varejo e o setor de alimentação funcionariam melhor em mãos privadas.

Quadros e família
Já havia rumores de que o Congresso do PC seria adiado. Em primeiro lugar, porque o encontro tem de tomar uma decisão delicada: o que fazer com o ex-ditador convalescente Fidel Castro, que foi substituído por Raúl em 2008 na Presidência do Conselho de Estado, mas manteve o cargo mais alto da hierarquia do país, o de primeiro secretário-geral do partido. Seu irmão é o segundo.
Para analistas como o sociólogo cubano Haroldo Dilla, o melhor para Raúl seria fazer a reunião após a morte do irmão, tido como melhor de saúde pelos presidentes que o visitam.
Há outro problema: Raúl fala em "preparar o partido" quando ainda reverberam os expurgos, em março, de duas promissoras lideranças de fora da velha guarda: o ex-vice-presidente Carlos Lage e o ex-chanceler Felipe Pérez Roque.
Com eles, acabaram sendo afastados vários aliados seus na burocracia, o que Raúl tenta compensar buscando lideranças jovens nas Províncias.
Além disso, o governo tem feito circular entre militantes um vídeo no qual condena a deslealdade dos defenestrados, apanhados pela espionagem fazendo comentários jocosos sobre um dos ícones dos "históricos", o vice-presidente Ramón Machado Ventura, 79.
O vídeo pode ser considerado um indicativo de que Raúl pretende enviar uma mensagem disciplinadora e reforçadora de sua autoridade antes de enfrentar a discussão de propostas apresentadas nos congressos.
Desde antes do expurgo, já circulavam propostas nos quadros rasos do PC e na academia. O grupo do ex-diplomata Pedro Campos, ainda que sem grande impacto, abriu debate na internet: cobra a permissão para a formação de correntes internas no PC, eleição direta no nível municipal e reforma do sistema eleitoral, além de um Estado "coadjuvante" na economia.
Há também quem aposte que o adiamento ajudará Raúl a fortalecer politicamente a segunda geração dos Castro -seu filho, que o assessora; a sexóloga Mariela Castro; e o mais velho dos filhos de Fidel, mais presentes na mídia oficial e em encontros com estrangeiros- antes do Congresso que tem a pretensão de marcar a virada geracional e garantir o futuro do regime. (FLÁVIA MARREIRO)


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