São Paulo, domingo, 01 de setembro de 2002

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ESPANHA

Colocado na ilegalidade sob acusação de cumplicidade com os terroristas, o Batasuna diz que vai "continuar na via política"

Partido do ETA descarta radicalização

ALCINO LEITE NETO
ENVIADO A SAN SEBASTIÁN (ESPANHA) E BAYONNE (FRANÇA)

Deputados do Batasuna, partido independentista do País Basco que foi colocado na ilegalidade na última semana pelo governo da Espanha, afirmam que não há riscos de radicalização do processo político na região. "O governo espanhol quer que entremos na clandestinidade, que radicalizemos. Mas vamos continuar na via política", disse à Folha o deputado Joseba Alvares Forcada, em San Sebastián (Espanha).
O único deputado do Batasuna no Parlamento Europeu, Koldo Gorostiaga, defende a mesma saída. "Apesar de não termos existência legal, teremos de demonstrar que a via política é a única que pode nos ajudar", disse ele em seu escritório em Bayonne, na região basca francesa, a 45 minutos de carro de San Sebastián.
O Batasuna, organização de esquerda, teve suas atividades suspensas e proibidas pela Justiça espanhola sob a acusação de cumplicidade e identidade com o movimento terrorista ETA.
Em menos de uma semana, esse partido de 23 anos e atualmente com cerca de 250 mil eleitores, deixou de existir. A suspensão de todas as atividades públicas do Batasuna (unidade, em basco) foi decretada pela Justiça na última segunda-feira. No mesmo dia, 88% dos parlamentares do Congresso espanhol votaram a favor de uma moção que pedia a interdição do partido. Na terça-feira, todas as sedes do Batasuna foram fechadas à força pela polícia do governo regional basco. Anteontem, o primeiro-ministro José Maria Aznar (centro-direita) aprovou a moção dos parlamentares.
Até agora, poucas manifestações de militantes ou simpatizantes foram realizadas contra a decisão. Nas ruas de San Sebastián, uma das principais cidades da região, há raros sinais de intranquilidade.
A interdição, porém, aumentou a tensão política em Euskadi (como é chamado o País Basco espanhol), região que dispõe de um governo autônomo, mas não independente, com sede em Vitória. Manifestações estão sendo planejadas no próximo dia 7 em várias cidades bascas.
O presidente do governo regional basco, Juan José Ibarretxe, do moderado Partido Nacionalista Basco (PNB), rival político do Batasuna, afirmou que "a paz [na região basca" está infelizmente mais distante hoje". Para ele, a interdição do partido "renova o fôlego ao ETA", que estava "refluindo politicamente, afetado por uma doença mortal", pois não teria mais o apoio dos bascos.
"Estou absolutamente convencido de que, se a sociedade basca deve proibir o Batasuna, isso precisa ser feito nas urnas", disse Ibarretxe numa entrevista coletiva anteontem, em San Sebastián.
Segundo o porta-voz do governo regional, Josu Jon Imaz, a decisão do governo espanhol leva "ao fortalecimento dos setores radicais" da política basca e cria uma "fratura no clima de entendimento".
O Batasuna é reconhecido pela população basca como um braço político do ETA (Euskadi Ta Azkatasuna, ou País Basco e Liberdade), criado em 1959. Mas o partido nega que participe das decisões do grupo terrorista e que um e outro sejam uma só coisa, como deduz um relatório do juiz Baltasar Garzón, com minuciosos dados que associam as duas organizações e serviu de base à interdição. Segundo Garzón, o ETA teria matado 836 pessoas desde 1968.
"Cerca de mil elementos provam de maneira clara que o Batasuna é a prolongação do terrorismo na política", afirmou anteontem o ministro espanhol da Justiça, José Maria Michavila.
Para representantes do Batasuna, os argumentos reunidos por Garzón são infundados, e a interdição do partido visa sobretudo a minar a democracia no País Basco e a colocar em xeque a autonomia política da região. "A suspensão do Batasuna vai demonstrar que a lei espanhola não dá garantias democráticas aos bascos", afirmou o professor de filosofia política Fito Rodriguez.



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