|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Bulgária vive apreensão com entrada na UE
Chegada do euro mergulha Sófia em misto de expectativa por benesses e medo de custo de vida maior
NATASHA MADOV
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE SÓFIA
Sófia, início de setembro.
Não há como negar: a expectativa é grande. Tanto que os sinais são percebidos já no aeroporto da capital búlgara, onde
parte dos guichês de imigração
ostenta o círculo de estrelas no
fundo azul e as letras "EU" indicando os destinados aos cidadãos da União Européia. Por
enquanto, é só decoração: o
mesmo guichê, ironicamente
sinalizado "NON-EU", atende a
todos. Bem-vindo à Bulgária.
Para os padrões da Europa
ocidental, é um país muito barato. Uma corrida de táxi que
cruze a cidade não supera 7 levs
(ou 3,5, R$10). Uma refeição
em restaurante de alto padrão,
com bebida alcoólica, fica por
12 levs, ou 6, por pessoa.
Isso se traduz em grupos de
turistas por todo o centro de
Sófia, andando pelas ruas pavimentadas de tijolos amarelos
que lembram histórias infantis.
Americanos, britânicos, alemães, franceses, todos de câmera e mapa na mão tentando
decifrar as placas em cirílico.
Pedir informação pode ser tarefa ingrata: são poucos os búlgaros com domínio rudimentar
do inglês. Nas ruas, cenas familiares ao Brasil: crianças ciganas, com roupas rasgadas, tentam lavar pára-brisas nos cruzamentos em troca de moedas.
Gesticulando muito, alguns
búlgaros contam suas expectativas para a entrada na União
Européia, marcada na última
semana para o ano que vem.
Um taxista manifesta apreensão com a máfia e a corrupção.
"Como vão dar jeito nisso?" E
mostra na prática: alguns levs
fazem o guarda que o havia parado por excesso de velocidade
"esquecer" a multa e se despedir com um aperto de mão.
Passando por uma área rural,
menos da metade dos terrenos
são cultivados. A explicação do
taxista, que conhece bem a região, é a falta de lucro. Sem subsídio, cultivar a terra não compensa. Os agricultores se mudaram para a capital em busca
de melhores empregos, e a terra ficou abandonada.
Dois pesos
A cidade é barata aos turistas,
mas cara para os búlgaros. Uma
servidora pública aposentada
conta que recebe 80 levs mensais de pensão. Para aumentar
sua renda, aluga os dois quartos
de seu apartamento na Evlogi
Gueorguiev, uma das melhores
ruas de Sófia. Ela ainda não sabe o que vai acontecer com a
conversão oficial ao euro.
Na Technopolis, uma megastore de eletrônicos impensável
sob a Cortina de Ferro, uma
vendedora conta que desistiu
de um empréstimo após se dar
conta de que receberia em levs,
mas pagaria juros em euros.
No centro, uma vendedora
de uma loja de souvenires diz
que é formada em ciência da
computação, mas a falta de colocação na sua área a levou a esse emprego, no qual ganha 10
levs por dia. "Minha filha fez 18
anos e quer um carro, mas como vou comprar um carro ganhando 10 levs por dia?" Um
carro com mais de dez anos de
uso custa em média 6 mil levs.
A loja fica ao lado do Tsum,
antiga loja de departamentos
transformada em shopping. O
comércio de luxo vai de vento
em popa; além das lojas caras
na rua Vitosha, espécie de Oscar Freire local, foi inaugurado
há quatro meses o Mall of Sofia,
com 130 lojas, restaurantes e
um multiplex com uma sala
Imax, para filmes em 3D.
Há construções por toda a
parte, bem como anúncios de
propriedades na capital e no
balneário de Varna, no mar Negro. Em uma filial da rede de cafés Happy, há nas mesas um pequeno display de uma consultoria imobiliária britânica
"pronta para ajudá-lo a fazer o
melhor investimento" . O contraste com o estado de abandono dos prédios residenciais da
Evlogi Gueorguiev, alguns centenários, é marcante.
Os "europeus", e seu dinheiro, estão chegando. Pronta ou
não, a Bulgária estará lá para
recebê-los.
Texto Anterior: Saiba mais: Guerra teve limpeza étnica e 110 mil mortos Próximo Texto: Hungria: Crise faz voto em Budapeste ganhar dimensão européia Índice
|