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Estimativa é que os preparativos militares anglo-americanos para a ação no Iraque estejam completos até o começo de março
Teatro de guerra ainda não está pronto
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
As estimativas correntes de que
a guerra anglo-americana contra
o Iraque só começaria na segunda
metade de fevereiro, ou no começo de março, não são baseadas
apenas na movimentação diplomática. Esse tempo é necessário
também para completar os preparativos militares, especialmente das forças terrestres.
Entre duas a três semanas são
necessárias para uma divisão de
infantaria mecanizada embarcar
seu equipamento e viajar de navio
para o golfo Pérsico. Desembarcar, aclimatar-se e organizar-se
para um ataque também tomaria
vários dias.
Uma divisão é uma unidade que
tem entre 10 mil e 15 mil homens
(o total depende do tipo, depende
do país). Por enquanto, os EUA já
definiram o envio da 3ª e da 4ª divisões de infantaria mecanizada,
respectivamente baseadas em
Fort Stewart (Geórgia) e Fort
Hood (Texas). Apesar do nome
"infantaria", essas unidades também têm um grande complemento de tanques.
Mobilidade
Atacar por terra com forças de
pronto emprego sem esperar pelo
total do contingente seria arriscado -embora surpreender o inimigo seja um princípio fundamental da guerra. Apesar de já
existir no Kuait um estoque de
tanques M-1 Abrams e blindados
de transporte de tropas M-2 Bradley, o grosso desses veículos teria
de vir por mar.
Empregar duas divisões com
ainda maior poder de fogo -a 1ª
Blindada e a 1ª de Cavalaria- e
outra com maior mobilidade -a
101ª de Assalto Aéreo- também
faz parte dos planos americanos.
A 101ª seria particularmente útil
pela sua alta mobilidade, pois está
equipada com dezenas de helicópteros de ataque (Apache), de
assalto (Blackhawk) e de transporte pesado (Chinook).
Cinco grandes navios de ataque
anfíbio, com cerca de 4.000 fuzileiros navais americanos a bordo,
estão no Golfo ou a caminho, assim como quatro porta-aviões.
As forças do Iraque
Em termos numéricos, as Forças Armadas do Iraque continuam respeitáveis. O Exército
tem cerca de 400 mil homens; entre 2.200 e 2.500 tanques (dos
quais 700 tanques russos T-72, o
mais moderno disponível); de
5.000 a 8.000 blindados diversos
de transporte de tropas; e 3.000
canhões.
O melhor equipamento está em
mãos da Guarda Republicana. O
resto do Exército é considerado
de pouco valor combatente.
Para compensar a inferioridade
numérica, os EUA contam com o
maior poder de fogo, especialmente na aviação. Qualquer contra-ataque em maior escala atrairia bombardeios imediatos.
Ataques aéreos
Durante toda a Guerra do Golfo
(1991) -que durou pouco mais
de um mês-, foram lançados
contra o Iraque cerca de 300 mísseis cruise ("de cruzeiro") Tomahawk pela Marinha americana, e
mais 35 mísseis lançados de avião
pela Força Aérea.
O objetivo agora seria concentrar ainda mais os ataques aéreos
e de mísseis. Uma estimativa veiculada pela televisão americana
afirma que cerca de 300 mísseis
cruise seriam lançados logo no
primeiro dia, com uma dose semelhante no dia seguinte.
Em 1991, em seis semanas de
ataques aéreos foram usadas duas
vezes mais bombas "inteligentes"
(guiadas por laser) do que contra
o Vietnã do Norte em nove meses
de bombardeio.
Na Guerra do Golfo em torno de
10% das bombas lançadas pelos
EUA tinham alguma forma de
guiagem eletrônica que as transformava em "armas inteligentes".
As outras eram bombas "burras",
de queda livre. Mas uma novidade tecnológica, usada nos bombardeios na antiga Iugoslávia e no
Afeganistão promete inverter o
percentual ao dotá-las de uma
"inteligência artificial".
O kit de modificação conhecido
como JDAM instala um sensor de
guiagem por satélite GPS nas
bombas "burras", tornando-as
capazes de acertar um alvo com
margem de erro de meros 13 metros, de noite ou de dia com visibilidade ruim.
Água
A tecnologia desenvolvida na
última década permite diminuir o
número de aviões deslocados para a região, graças à maior precisão do armamento.
Mas as forças terrestres ainda
dependem de um suporte logístico considerável, ainda mais se o
objetivo for atingir Bagdá a partir
da fronteira kuaitiana.
Calcula-se que uma moderna
divisão blindada americana consuma entre 1.000 e 1.500 toneladas
de suprimentos por dia (como
comparação, uma divisão Panzer
alemã de 1940 exigia apenas 300
toneladas).
Um soldado em combate no calor do Iraque consome vários litros de água. Os veículos, principalmente os tanques, também
"bebem" muito. Um tanque M-1
Abrams, em terreno firme, consome 4,3 litros de combustível por
quilômetro. E são 550 km de Basra até Bagdá.
O maior desafio para os EUA e
seus aliados não é destruir fisicamente as Forças Armadas do Iraque. A guerra passada mostrou
que isso é relativamente fácil. O
desafio é vencer a guerra rapidamente, com pouco dano à infra-estrutura do país, já que o objetivo
é criar um novo Iraque pró-ocidental e quiçá até democrático
(não foi o caso do Kuait "liberado"). E isso significa acertar alvos
precisos: Saddam Hussein e suas
bases de apoio.
Especulações de como seria
uma guerra estão em toda parte.
O mesmo aconteceu no conflito
de 1991. Mas apesar de miríades
de "estrategistas de poltrona" darem palpites, mesmo assim os
EUA e a coalizão aliada conseguiram então obter uma raríssima
surpresa estratégica.
Em vez de atacar diretamente os
iraquianos no Kuait, o comandante americano, hoje general
aposentado do Exército, Norman
Schwarzkopf, fez um longo desvio
para oeste, avançando profundamente dentro do próprio Iraque.
Esse brilhante "gancho de esquerda" fez a guerra terrestre ser vencida em apenas cem horas.
Naquela oportunidade, assim
como agora, havia um bom número de fuzileiros navais a bordo
de navios especializados em ataque anfíbio.
Mas não houve nenhum desembarque tipo "Dia D" (a fundamental reconquista da França
ocupada pelos nazistas a partir da
Normandia, em 1944).
Flexibilidade
Além dos marines americanos,
há dois batalhões de fuzileiros navais britânicos -"royal marine
commandos" 40 e 42- a caminho da região, hoje fazendo exercícios no Mediterrâneo. São duas
das unidades que ajudaram a retomada das ilhas Falklands/Malvinas dos argentinos em 1982.
Se haverá alguma surpresa estratégica em caso de guerra, obviamente só o tempo dirá. Mas a
concentração de forças altamente
profissionais, com maior poder
de fogo e dotadas de tecnologia
muito superior, embora numericamente inferiores, dá uma flexibilidade crucial aos planejadores
anglo-americanos.
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