São Paulo, segunda-feira, 02 de abril de 2001

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ANÁLISE
Tribunal local pode ser escala para Haia

SÉRGIO MALBERGIER
EDITOR DE MUNDO

O ex-ditador iugoslavo Slobodan Milosevic foi responsável, direta ou indiretamente, pelas maiores atrocidades cometidas na Europa desde o final da Segunda Guerra Mundial (1939-45). Usou o histórico e arraigado nacionalismo sérvio para manter-se no poder ao longo dos anos 90, durante o desmantelamento da Iugoslávia, inspirando ou comandando guerras que deixaram centenas de milhares de mortos na Croácia (91), na Bósnia (92-95) e em Kosovo (99).
Mas sua prisão só ocorreu, na madrugada de ontem, por causa de uma lei aprovada pelo Congresso dos EUA condicionando a ajuda à Iugoslávia à cooperação do novo governo do país com o tribunal da ONU que quer julgar Milosevic por crimes de guerra em Kosovo.
A prisão é um dos maiores trunfos da "nova ordem mundial" proclamada pelo então presidente dos EUA, George Bush (pai do atual presidente), no início dos anos 90, após o colapso da União Soviética.
Em um mundo unipolar, com Washington como potência hegemônica, foi uma lei norte-americana, aprovada por congressistas eleitos em seus Estados por suas posições em relação a assuntos localizados, que selou o fim do mais sanguinário líder europeu da segunda metade do século.
Ao aceitar o prazo estabelecido por Washington para agir contra seu antecessor, o presidente iugoslavo, Vojislav Kostunica, um nacionalista sérvio moderado, foi pragmático. Preferiu correr o risco de detonar as últimas balas dos aliados de Milosevic a perder a indispensável ajuda econômica externa.
Ao longo das 36 horas de impasse que acabaram com a rendição de Milosevic, comentaristas fizeram alusões a Hitler e ao criminoso norte-americano Al Capone. Milosevic acabaria como o primeiro, suicidando-se em desgraça em seu bunker, ou como o segundo, a quem eram atribuídos vários assassinatos e crimes violentos, mas que acabou na cadeia por sonegação de impostos.
Do jeito que está, parece mais como Al Capone, já que está enfrentando acusações na Justiça iugoslava de crimes financeiros contra o Estado.
Mas, com os EUA e países europeus dizendo que a prisão de ontem foi apenas o primeiro passo rumo à entrega de Milosevic ao tribunal internacional da ONU, é possível que o julgamento iugoslavo sirva para expor em detalhes à população do país os crimes cometidos pelo ex-ditador e sua gangue. Desmoralizado e desmascarado mesmo entre seus poucos simpatizantes que restam, seria mais fácil mandá-lo para o tribunal de Haia.


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