São Paulo, domingo, 02 de julho de 2006

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Do exílio na Síria, Meshal radicaliza o grupo

ZVI BAR'EL
DO "HAARETZ"

Khaled Meshal deve estar se sentindo realizado, finalmente. Depois de lutar durante anos por um espaço nos primeiros escalões do Hamas, de superar o desprezo do xeque Ahmed Yassin (o fundador do grupo), que se referia a ele como "aquele garoto", e de sobreviver a um ataque do Mossad em Amã, ele finalmente conseguiu ser reconhecido por Israel. Já não é mais um mero procurado, nem só o chefe de um bando, mas a pessoa que controla toda a violência nos territórios palestinos e que, do exílio em Damasco, tem endurecido a posição do Hamas na negociação sobre a soltura do soldado israelense seqüestrado. O próprio Meshal não esperava alcançar um status tão elevado -porque o "campo" e Meshal estão longe de ser idênticos. No "campo", há celas, bandos, organizações e movimentos cuja constante comum é a mobilidade. Por exemplo, Jamal Abu Samhadana, o comandante de um dos Comitês de Resistência Popular que foi morto no início do mês em um ataque israelense, integrava o Fatah. Outro comitê era encabeçado até pouco tempo atrás por Mumtaz Daramshe, que fazia parte do Hamas, até que uma disputa o levou a criar seu grupo próprio, agora conhecido como Exército do Islã.

Lealdade volátil
Os movimentos nos escalões de liderança desses grupos sempre são acompanhados por movimentação dos combatentes fiéis ao comandante. Essa lealdade nem sempre depende de uma ideologia -em muitos casos depende de amizade e de um passado comum. Meshal não tem informações privilegiadas sobre essa mobilidade organizacional, nem tem conhecimento de cada ataque e de todas as conspirações. Alguns dos comandantes que atuam em campo não reconhecem Meshal, nem os chefes de qualquer outra organização, como seus líderes. Quem desobedece ao primeiro-ministro Ismail Haniyeh não necessariamente obedece a Meshal. Mesmo as iniciativas políticas locais, como o "documento dos prisioneiros", que originou o esboço de acordo entre as facções palestinas, são lançadas contra a vontade de Meshal. Meshal concordou com a "hudna" (o cessar-fogo com Israel) apenas por medo de perder sua posição de liderança nos territórios. A hostilidade entre Meshal e Haniyeh veio à tona em abril, quando o premiê ameaçou renunciar se Meshal não retratasse suas declarações bombásticas contra o presidente palestino, Mahmoud Abbas. Nascido em 1956, Khaled Meshal é bacharel em física pela Universidade do Kuait. Até a Guerra do Golfo, de 1990, ele residia no Kuait, para onde se mudou vindo de Silwad, nas proximidades de Ramallah, depois de Israel ter conquistado os territórios, em 1967. Quando, após a guerra, o Kuait deportou os palestinos residentes no país, devido ao apoio que eles tinham dado à invasão do Iraque, Meshal mudou-se para a Jordânia com sua família. A tentativa de assassinato dele feita pelo Mossad em 1997, que levou à libertação de Ahmed Yassin da prisão, colocou Meshal no mapa. Em 2000 ele foi deportado da Jordânia, juntamente com quatro outros líderes do Hamas, e hoje se desloca entre Síria, Líbano e Irã. O chefe da inteligência egípcia, Omar Suleiman, costuma reunir-se com Meshal. Os dois conversaram nesta semana, enquanto o ditador egípcio, Hosni Mubarak, conversava com o ditador da Síria, Bashar Assad. Meshal nega ter envolvimento no seqüestro do soldado. Como o Hamas nunca teve problema em reivindicar ações no passado, é possível que Meshal esteja dizendo a verdade.


Tradução de CLARA ALLAIN



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