São Paulo, sábado, 02 de outubro de 2004

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Evento ignora questões sobre América Latina

DE NOVA YORK

A julgar pelo debate de anteontem entre George W. Bush e John Kerry, a América Latina não tem lugar no mundo. Ou o território já tem "dono" -segundo pesquisa da Zogby publicada ontem pelo "Miami Herald", 60% dos latinos nos EUA devem votar em Kerry, e 32% em Bush.
Em uma hora e meia de confronto verbal sobre a política externa dos EUA, nenhum dos dois candidatos mencionou a região uma única vez. O mediador, Jim Lehrer, tampouco o fez.
Ironicamente, o evento teve lugar na Flórida, Estado americano que concentra boa parte dos milhões de imigrantes latino-americanos no país e que abriga uma grande colônia de refugiados cubanos, tema que em outras ocasiões pareceu mais caro a Bush.
O presidente tentou remendar a falha mais tarde, em evento de campanha no Estado -que, aliás, é governado por seu irmão. "A única coisa que me decepcionou no debate foi que não houve nenhuma pergunta sobre Cuba", disse em Miami.
Mas os representantes da região não deixaram de notar o lapso. "Que vergonha", dizia a deputada governista Ileana Ros-Lehtinen ao "Sun Sentinel", diário que circula no sul da Flórida. "Foi uma oportunidade perdida não fazer uma única questão sobre a América Latina numa comunidade tão internacional."
Na CNN, tão logo o debate terminou, o jornalista Jorge Ramos reclamava com o apresentador Larry King da ausência do tema. "Não se falou em acordo de migração com o México, não se falou em Cuba, não se falou em acordos com a América Central", lamentava Ramos, um dos mais célebres jornalistas latinos dos EUA e âncora da rede de TV Univision, especializada no público hispânico. King respondeu que era "um debate sobre o Iraque e guerra ao terror". Ramos o corrigiu: "Não, era um debate sobre política externa".
A impressão tirada do debate é que ambos estão certos, e que a política externa com a qual os EUA se preocupam se limita ao terrorismo, à ameaça nuclear, às armas de destruição em massa. Fora deste tópico a única questão mencionada no debate foi o genocídio em Darfur, no Sudão.
Mesmo assim, os candidatos responderam muito brevemente à questão levantada por Lehrer -mandar ou não tropas para o país africano-, e logo viraram o assunto de volta para o Iraque.
No dia do debate, o "Miami Herald" publicou uma reportagem na qual o secretário-assistente de Estado para o hemisfério Ocidental, Roger Noriega, defendia a posição de seu governo em relação à América Latina.
"Observadores internacionais concordam em um ponto: os EUA não estão fazendo o bastante pela América Latina, mas eles não dizem o bastante do que", ironizou Noriega. (LUCIANA COELHO)


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