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EUA
Silêncio e preservativos
Contardo Calligaris/Folha Imagem
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Preservativos com imagens de Palin, Obama e John McCain
CONTARDO CALLIGARIS
No avião de São Paulo a Nova
York, na última quinta, minha
vizinha (americana) pergunta:
"Você está voltando para votar?". A mesma coisa se repete
na chegada. Por exemplo, na
sexta de manhã, passo por uma
agência de meu banco, e, conversando com o gerente, ele
também pergunta: "Então, voltou para votar?".
O curioso é que, nessas indagações, ninguém parece querer
saber em quem votarei. Mas
não é por respeito pelo segredo
do voto; é que todos os meus interlocutores supõem "naturalmente" que eu vote em Obama,
ainda mais voltando de longe
para votar. É como se querer
votar significasse querer votar
em Obama.
De fato, quem está decidido a
votar em McCain (e deve haver
muitos) não conversa. Ao menos em Nova York, a escolha de
McCain é envergonhada e silenciosa.
Ainda na sexta, decido almoçar num de meus restaurantes
preferidos do Harlem, Louise
Family Restaurant, na esquina
da rua 121 com a Lenox Avenue
(que, nesse trecho, chama-se
Malcolm X Boulevard).
Quem sabe Julia (que cozinha no balcão) me reconheça, e
a gente bata um papo sobre a
candidatura de Obama vista do
Harlem. Decepção: o restaurante está fechado. No fim de
agosto, uma inspeção sanitária
encontrou baratas, roedores e
alimentos contaminados.
Comi várias vezes, no passado, no Louise e não fiquei doente, mal talvez tenha tido sorte.
Diante do estabelecimento
fechado, penso apenas que a segunda "Harlem Renaissance",
prevista desde que Bill Clinton
instalou por lá seu escritório de
ex-presidente, não aconteceu.
Subiram os aluguéis e o custo
do metro quadrado, e alguns
brancos se mudaram para lá
(há casas lindas nas travessas
do Malcolm X Boulevard), mas
o conjunto continua triste, na
espera de dias melhores.
Passeio pela rua 125 e pela
Lenox. Muitas lojas (óticas, cabeleireiros, farmácias, supermercados) expõem na vitrina
um modesto cartaz (digamos,
50cm por 80cm), sóbrio, com
apenas a inscrição "Obama
2008" ou "New York for Obama and Biden".
Na Lenox com a 117, num
carrinho de cachorro-quente, o
mesmo cartaz aparece com
mais destaque. Com o dono do
carrinho e nos estabelecimentos nos quais paro para um petisco com café tento conversar
sobre as eleições. Ganho sorrisos e palavras condescendentes, mas ninguém está a fim de
tocar no assunto. Mesmo quando fico na minha e escuto a conversa ao meu redor, constato
que o tema é quase ausente.
Vinte blocos mais ao sul, ao
redor da Universidade Columbia, é o contrário: como no
avião e no banco, todos só querem falar disso.
Em suma, para a elite branca
de Manhattan, votar em Obama é uma festa. Deve haver,
nessa euforia, a esperança de
acabar de vez com a culpa que
ainda envenena as relações raciais nos Estados Unidos.
No Harlem, ao contrário, não
se fala em público da eleição e
de Obama talvez por superstição ou por medo de que a festa
da comunidade afro-americana
apareça como uma provocação
e leve os brancos a pensar duas
vezes. O apoio de líderes negros
radicais, como Louis Farrakhan, da Nação do Islã, é muito
discreto e propagandeado, justamente, pela campanha de
McCain.
Sexta-feira era também Halloween; nova-iorquinos e turistas passearam em massa,
mascarados, pelas ruas da cidade. Estranhei não encontrar
ninguém disfarçado de Obama
ou de McCain. A espécie de carnaval que é aqui o Dia das Bruxas parecia ignorar a política.
Só tarde da noite, em Times
Square, encontrei um homem
que, vestido de palhaço, vendia
preservativos "políticos", com
legendas mais sutis do que pareciam à primeira vista.
Os de Palin diziam: "Quando
o aborto não é uma opção, preservativos Palin; *aprovados
pelas mamães do hockey" [referência às supostas mães típicas de classe média que levam
os filhos para praticar esse esporte].
Os de McCain: "Velhos, mas
não vencidos, preservativos
McCain; *aprovados para veteranos" [de guerra].
E os de Obama: "Use com
moderação, preservativos Obama; *disponíveis também em
tamanho menores".
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