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Brasileiros no Suriname se lançam às armas
Após ataque em Albina, comunidade de Benzdorp exibe seguranças com fuzis e metralhadoras e deixa espingardas prontas
Região conta apenas com 9 policiais; a relação com os "morenos" locais é em geral pacífica, mas marcada por uma antiga desconfiança
Ayrton Vignola/Folha Imagem
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Policiais armados fazem segurança dos cerca de 300 brasileiros que vivemna vila de Kabanna-Four, que fica próxima a Benzdorp
FÁBIO ZANINI
AYRTON VIGNOLA
ENVIADOS ESPECIAIS A BENZDORP
(SURINAME)
Primeiro, veio a notícia de
que 600 "morenos" estavam
subindo o rio Maroni para repetir no garimpo de Benzdorp o
massacre contra brasileiros em
Albina, na véspera do Natal.
Depois, chegou a informação
de que dez ou 15 canoas estavam a caminho, com surinameses armados. Até agora, nada.
Mas foi o suficiente para levar medo à comunidade de
2.500 brasileiros que fazem de
Benzdorp uma cidade verde-amarela a 500 km da capital do
Suriname, Paramaribo.
Na dúvida, garimpeiros e ribeirinhos brasileiros passaram
o fim de 2009 se armando para
um ataque. "Se eles vierem, é na
boca da 12", diz Ricardo Ferreira, dono de uma espingarda calibre 12 de repetição, com capacidade para seis cartuchos. "Em
Albina, pouca gente tinha arma. Aqui é diferente", afirma.
As armas são apropriadas para o ambiente no meio da floresta amazônica, cujo acesso é
apenas por canoa ou avião. São
para caçar macaco, anta, capivara e cotia. Mas podem ter outra função em tempos de conflito. "A arma serve para tudo",
diz, em termos ameaçadores,
Reginaldo, 30, conhecido como
"Mau Elemento". "Aqui, quem
tem arma não fala, e quem não
tem fala que tem", diz seu irmão Raimundo Froes Filho, 38.
Em Benzdorp, brasileiros e
"morenos" vivem juntos há décadas, com episódios de violência esporádicos -um assalto,
uma briga de bar. A sensação é a
de que o tempo não superou a
desconfiança mútua.
Os garimpeiros começaram a
chegar no final dos anos 80. Encontraram descendentes de escravos africanos já estabelecidos em pequenas roças e garimpos, os maroons -para os
brasileiros, "morenos".
As duas comunidades se misturam em vilarejos e trabalham
juntas em alguns garimpos.
Mas em Albina, lembram os
moradores, sempre houve paz.
"A relação com os "morenos"
hoje é tranquila, mas num momento isso pode mudar", diz o
pastor Osmar Abimael, líder local da igreja evangélica brasileira Assembleia de Deus.
Metralhadoras e fuzis
Entre o Natal e o Ano Novo,
alguns brasileiros se cotizaram
para contratar seis policiais do
Suriname como seguranças.
Por sete dias, homens vestindo
coletes da polícia desfilaram
com metralhadoras e fuzis.
Um deles, que se identificou
apenas como Mike, disse que a
polícia não dá conta de proteger a região. "Somos nove policias apenas. Já pedimos reforço, mas nunca chegou", diz.
O problema é o que acontecerá quando forem embora. "Depois de 2 de janeiro [ontem],
quem vai nos proteger?", diz
Maria Oseni, dona de mercado.
Foi ela quem recebeu uma
chamada por rádio na véspera
de Natal, alertando para o que
estava acontecendo em Albina,
a um dia de canoa motorizada,
no mesmo rio Maroni. Algumas
pessoas fugiram para o mato.
Outras se trancaram em casa.
Como nada aconteceu, o tamanho real da ameaça passou a
ser assunto nas mesas dos botecos de Benzdorp. "Existem
quatro ou cinco barreiras policiais no rio. Não existe possibilidade de montarem um ataque
contra nós sem sabermos com
antecedência", diz o comerciante Deusdeth Gomes.
Ao longo do rio, dezenas de
pequenas comunidades de
"morenos" vivem do garimpo,
agricultura ou criação de gado. São do mesmo grupo étnico dos de Albina e falam a
mesma língua, o tak-tak. Pelo
menos nos locais que a Folha
visitou, não se percebe nenhuma agressividade.
"Somos diferentes dos que
vivem em Albina. Somos amigos dos brasileiros", diz Jerry
Vandriesa, 31, que fala português fluente após ter trabalhado 11 anos com brasileiros.
Ali perto, o garimpeiro Roberto Komse, 30, aproveitava
o feriado de 1º de janeiro descansando com quatro amigos
"morenos", ouvindo reggae e
fumando maconha.
Não parecia prestes a deflagrar um ataque. "Aqui os "morenos" trabalham e só pensam
em ouro. A gente não tem
tempo de brigar", afirma.
Para brasileiros traumatizados, porém, só a garantia
verbal não basta. "Estou com
muito, muito medo", diz Maria Oseni.
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