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Garimpeiros se arriscam na Guiana Francesa
Vizinha, a última possessão ultramarina da América do Sul possui garimpos melhores, mas proíbe extração brasileira
Se são pegos pelos policiais franceses, ilegais brasileiros perdem tudo; ter filhos no país, porém, é chance de obter a cidadania europeia
DOS ENVIADOS A BENZDORP
É uma cena comum. Brasileiros que moram na comunidade
de Benzdorp, no Suriname,
apontam para seus filhos pequenos e repetem com orgulho:
"É francesinho". São elas,
crianças nascidas nos hospitais
da Guiana Francesa, do outro
lado do rio Maroni, que poderão abrir as portas da União Europeia para seus pais.
São menos de 500 metros
nas águas quentes e tranquilas
do rio, atravessados em canoas
a motor em menos de dez minutos, e chegamos ao que os locais denominam simplesmente
de "a França".
Tecnicamente, nada mais
correto: a Guiana Francesa, última possessão ultramarina da
América do Sul, é território soberano francês.
A relação dos garimpeiros
com "a França", porém, é ambivalente. É um esporte local dizer cobras e lagartos dos gendarmes, a polícia francesa, que
proíbe os brasileiros de garimpar livremente no território.
O garimpo na Guiana Francesa é considerado mais promissor do que o no Suriname, e
por isso vários brasileiros se
aventuram pela mata.
Mas são ilegais. Quando são
pegos, ficam sem nada: ouro,
barco, máquinas e motos, que
são queimados no ato ou levados para leilões em Caiena, a
capital do Departamento.
A Folha testemunhou o ato
de apreensão de um motociclo
com tração 4x4 de um garimpeiro brasileiro pela polícia
francesa no porto da cidade de
Maripasoula, a principal da região da Guiana Francesa. Cerca
de dez policiais carregavam o
veículo em uma canoa.
"É só a gente começar a arrumar uma condição de vida melhor que eles [os gendarmes] te
jogam na lona de novo", diz José Araújo Melo, 42.
Canoeiros locais se especializam em encontrar caminhos
no rio e na mata para evitar patrulhas de franceses. Uma rede
de comunicação por rádio entre brasileiros se formou, ligando vários pontos do garimpo.
Também há dificuldades legais para os brasileiros entrarem e circularem livremente
pelo território, embora a fiscalização mal seja feita. A reportagem da Folha pegou uma canoa no povoado de Nouveau
Wacapou, na margem francesa,
passou meia hora no local e
voltou para o Suriname sem
ser incomodada.
Mas os franceses abrem uma
importante exceção. Deixam
mulheres brasileiras grávidas
irem ao hospital de Maripasoula, a meia hora de canoa de
Benzdorp, para terem seus bebês -em alguns casos, até para
fazer exames pré-natal.
Há ainda uma certa tolerância no atendimento a doentes.
Chance de cidadania
Se no garimpo do lado do Suriname a estrutura de saúde é
precária, no lado francês há
uma unidade bem equipada. "O
hospital de lá não tem comparação... eles têm especialistas
em tudo", diz Ozeias Carneiro,
25, pai de Ana Carolina, 1.
As crianças recebem um carnê de saúde do governo francês
e podem retornar para vacinas.
Como nasceram na Guiana
Francesa, podem requerer cidadania francesa, um trâmite
que geralmente é feito pela
Embaixada do Brasil em Paramaribo, que encaminha a documentação às autoridades em
Caiena.
Os "francesinhos" também
terão direito de estudar nas escolas do lado da Guiana Francesa, consideradas melhores, e
poderão nesses casos estar
acompanhadas dos pais. "Se eu
tiver três ou quatro filhos estudando lá, o governo não poderá
me tirar", afirma Carneiro.
Mais ao norte, a cidade de
Saint Laurent é o outro local
popular para ter filhos. Fica em
frente a Albina, no Suriname,
onde ocorreu o ataque aos garimpeiros na véspera de Natal.
Pais que tiveram seus bebês lá
agora tem medo de voltar para
vacinar seus filhos.
(FÁBIO ZANINI e AYRTON VIGNOLA)
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