São Paulo, sábado, 03 de março de 2007

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Escândalo da máfia policial aguarda Bush na Guatemala

Deputados do vizinho El Salvador foram mortos por policiais e depois assassinados

Agentes e parlamentares são acusados de vínculo com o narcotráfico; prisões no país são controladas por grupos semelhantes ao PCC

Daniel LeClair/31.jan.2007/Reuters
Nobel da Paz Rigoberta Menchú é candidata à Presidência neste ano


RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma sucessão de crimes que parece saída do roteiro de "Os Infiltrados", filme vencedor do Oscar, paralisa a Guatemala nas últimas duas semanas. O país da América Central, tradicional aliado dos EUA, está no roteiro da visita que George W. Bush fará à América Latina a partir do dia 8 deste mês.
No dia 19 de fevereiro, três deputados do vizinho El Salvador e seu motorista foram assassinados pelos próprios policiais responsáveis por sua segurança na Guatemala. Dias depois, os quatro policiais guatemaltecos, presos pelo crime, foram mortos na prisão de segurança máxima onde aguardavam para prestar depoimento.
O governo de El Salvador exige explicações e, a pedido do presidente guatemalteco, Oscar Berger, até o FBI, a polícia federal americana, mandou quatro especialistas para investigar os crimes. Bush chega no dia 11 à Guatemala, que faz parte do grupo de países nos quais os EUA querem promover a produção de etanol.
Os assassinatos são os últimos de uma série de evidentes "queimas de arquivo", provas de corrupção policial e de vínculos do narcotráfico com o sistema penitenciário, dominado pelas versões locais do PCC.
A violência já é o grande tema da campanha para as eleições presidenciais de setembro. A personalidade guatemalteca mais conhecida no exterior, a líder indígena e Prêmio Nobel da Paz Rigoberta Menchú, é candidata e declarou que o país está ajoelhado diante da violência: "O crime organizado, a corrupção e o narcotráfico são forças incrustadas no Estado".
Outro candidato é o general Otto Pérez Molina, ex-chefe de Inteligência do Exército, que faz campanha focada na linha dura contra o crime.
"Já temos certeza de que a cena do crime, do assassinato dos policiais, foi adulterada com restos de cartuchos que não têm relação com as armas usadas, e que houve tortura", disse à Folha o procurador dos Direitos Humanos da Guatemala, Sergio Morales.
Nomeado pelo Congresso, Morales diz que "falta vontade política para depurar a polícia, parte do crime organizado".
Os deputados salvadorenhos foram mortos quando iam a uma reunião do Parlamento Centro-Americano, com sede na Guatemala. As evidências apontam que tanto policiais quanto deputados eram ligados ao narcotráfico.

Hidromassagem na cela
O escândalo das execuções dentro da prisão é maior porque, em setembro passado, o governo lançou uma operação espetacular para "recuperar o controle das prisões do país".
Centenas de soldados e policiais invadiram a principal prisão de segurança máxima guatemalteca, a Fazenda Modelo de Reabilitação de Pavón. Dali, o "Marcola" local comandava seqüestros e tráfico de drogas por celular. Tinha até uma banheira de hidromassagem em sua cela. A operação foi considerada um sucesso, ainda que sete presos tenham sido mortos durante a invasão.
O procurador Sergio Morales qualificou as mortes durante a operação de "execuções extrajudiciais". "A polícia entrou para matar e a hipótese de queima de arquivo é forte."
A operação nas prisões foi tão elogiada que o chefe do sistema penitenciário, Alejandro Giamatei, tornou-se o candidato presidencial governista.
Depois da intervenção americana de 1954, que derrubou o governo nacionalista de Jacobo Arbenz, a Guatemala viveu três décadas de guerra civil, envolvendo guerrilhas comunistas contra governos civis e ditaduras militares.
Mais de 200 mil guatemaltecos morreram no conflito. Um acordo de paz foi assinado em 1996, mas o país nunca se pacificou de vez. Há 1 milhão de armas sem registro circulando na Guatemala, que tem 12 milhões de habitantes. Gangues juvenis, conhecidas como "maras", matam e seqüestram em troca de pouco dinheiro ou drogas.
Para a ativista dos direitos humanos e diretora da ONG Segurança em Democracia Iduvina Hernández, "a guerrilha foi desarmada, mas a polícia e o Exército não foram depurados". "Vemos que os mesmos padrões de execução da guerra civil se repetem", diz ela.


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