São Paulo, domingo, 03 de abril de 2005

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A MORTE DO PAPA

Polonês Karol Jozef Wojtyla, que liderou católicos por quase 27 anos, morreu às 16h37 (horário de Brasília) em seu apartamento no Vaticano

João Paulo 2º, 84, está morto

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ROMA

A agonia do papa João Paulo 2º, 84, terminou na noite de ontem no Vaticano. "O santo padre morreu nesta noite, às 21h37 [16h37 em Brasília], em seu quarto privativo", anunciou ontem a Santa Sé, em nota. Às cerca de 70 mil pessoas que acompanhavam o sofrimento do líder da Igreja Católica, o arcebispo Leonardo Sandri disse: "Nosso santo padre João Paulo retornou à casa do Pai".
"O procedimento previsto pela constituição apostólica no "Universi Dominici gregis", promulgada por João Paulo 2º em 22 de fevereiro de 1996 foi colocado em vigor", conclui o texto do Vaticano, em referência ao trâmite oficial após a morte do pontífice.
A saúde do papa, já debilitada desde a última década, vinha se deteriorando de forma mais intensa e rápida nos últimos meses. Desde que fora submetido a uma traqueostomia no mês passado, o pontífice não mais conseguiu recuperar plenamente suas forças.
Horas antes do anúncio, o cardeal Joseph Ratzinger, chefe da Congregação para a Doutrina da Fé e, como tal, uma espécie de xerife dos princípios da Igreja Católica, já deixava claro que a morte era uma questão de algumas horas: "O pontífice sabe que está passando para as mãos de Deus".
Pelo relato de seu porta-voz Joaquín Navarro-Valls, o papa ainda travou um diálogo indireto com os jovens que formavam a maior fatia do nutrido grupo de fiéis que varou a madrugada rezando por ele na praça de São Pedro.
Os jovens, quase todos "Papa Boys", como são chamados os militantes das Jornadas Mundiais da Juventude, perguntavam, cantando: "Que cosa ha venito a cercare?" (Que coisa veio procurar?).
O coro respondia: "Ho venito a cercare Cristo" (Vim procurar Cristo). O papa respondeu ao cântico que, pronunciado no silêncio da praça na madrugada, devia chegar ao terceiro andar do Palácio Episcopal, onde ficam os seus aposentos.
"Vi ho cercato/Adesso siete venuti da me/e per questo vi ringrazio" (Eu os procurei, agora vocês vieram a mim e por isso lhes agradeço), disse, de forma entrecortada, com imensa dificuldade, conforme a reconstituição que Navarro-Valls fez pela manhã aos jornalistas, acrescentando que, "provavelmente", o papa se referia aos jovens, que ele havia procurado (trazer à igreja), que vieram até ele e aos quais agradecia.
O diálogo indireto prosseguiu: a partir do momento em que as emissoras de TV e a internet difundiram a frase do papa na boca de seu porta-voz, o afluxo de jovens à praça aumentou.
A frase, supostamente sobre os jovens, talvez tenha sido o último momento de consciência de João Paulo 2º. Na véspera, circulara a informação de que o papa perdera a consciência, o que o Vaticano desmentiu, sem impedir que o boato (ou o fato) continuasse.
Ontem cedo, no entanto, Navarro-Valls afirmou que, "no amanhecer de hoje (sábado), foi observado um comprometimento inicial do estado de consciência" e que "as condições gerais, cardiorrespiratórias e metabólicas do papa mantêm-se substancialmente sem variações e, portanto, gravíssimas".
Mas o porta-voz fez questão de dizer que, "tecnicamente", a perda de consciência não significava que o papa tivesse entrado em estado em coma. "Ele reage sempre que alguém se dirige a ele", afirmou Navarro-Valls.
Pouco após as 19h (14h em Brasília), um novo boletim mantinha as mesmíssimas informações sobre o "gravíssimo" estado do papa, acrescentava que ele estava com "febre alta". O anúncio final veio duas horas e meia depois.
Os jornais italianos de ontem, sem exceção, trataram do tema papa como se João Paulo 2º já estivesse nas mãos de Deus. Cadernos especiais como o de "La Repubblica" ou as 25 páginas de "Corriere della Sera" já falavam dos possíveis sucessores, descreviam com detalhes abundantes como seria o processo para o anúncio da morte, para o funeral e para a escolha do novo papa.
Serão nove dias de cerimônias fúnebres e entre 15 e 20 dias, a partir da morte, para começar o conclave, a reunião do Colégio de Cardeais (118 no total) que escolhe o papa.
O tratamento de fato consumado para a morte chegou ao ponto de Vittorio Messori, no "Corriere della Sera", antecipar o que considera que deveria ser um dos "primeiros esforços" do novo papa: "instruir o processo de beatificação de Karol Wojtyla". Para a massa de jovens que afluía à praça São Pedro, o processo de beatificação parecia dispensável.
Mesmo antes da morte, Karol Wojtyla já era tratado com a devoção que os crentes dedicam apenas a seus santos muito queridos. Talvez por isso, os médicos que cuidam do papa deixaram vazar, à tarde, que o estado do pontífice continuava "gravíssimo", mas o coração resistia. Na praça, a jovem polonesa Edwige contava que viera da capela dedicada à Madona Negra de Czestochowa, na basílica de São João Latrão, e dava sua explicação para a resistência do coração do papa: "A Madona com o seu manto materno continuará a protegê-lo".
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