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Nossa derrota serviu de exemplo político, dizem ex-mineiros grevistas
PEDRO DIAS LEITE
ENVIADO ESPECIAL A BARNSLEY E
ORGREAVE
Antes do confronto, eles somavam 200 mil, espalhados
por 130 minas de carvão. Vinte
cinco anos depois, não passam
de 1.800, em apenas seis minas
restantes. Nenhuma trajetória
expõe tão bem a visão econômica dos anos Thatcher quanto
a dos mineiros britânicos, reduzidos a pó depois de uma greve de 16 meses, em 1984 e 1985,
que terminou em nada.
Ao quebrar o então mais poderoso sindicato do país, Thatcher fez valer seu programa de
fechar as minas, mas conseguiu
mais do que isso. Daquele ponto em diante, todos os sindicatos do país sabiam que não era
possível contestar o governo,
que o neoliberalismo e o enfraquecimento dos direitos trabalhistas estavam ali para ficar.
Nas ruas de casinhas iguais,
os tempos difíceis provocados
pela recessão dos anos 80 parecem mais distantes, ao menos
na superfície. Mas basta surgir
o nome de Thatcher para ódios
antigos surgirem das profundezas onde estavam enterrados.
"A maioria dos sindicatos viu
como ela nos destruiu, então
perceberam que não havia nada a fazer, porque senão seriam
destruídos também", afirma
Chris Kitchen, 42, secretário-geral do que restou da NUM
(Sindicato Nacional dos Mineiros, na sigla em inglês), na sede
da entidade, em Barnsley.
A economia sofreu uma mudança radical, mas os efeitos
das mudanças dos anos Thatcher ainda deixam a região
comparativamente pior que
outras partes do país.
"Algumas partes do país continuam a sofrer dos problemas
econômicos resultantes do declínio do emprego tradicional
-especialmente em mineração, aço e manufatura. Esses
problemas têm raízes profundas e tem havido progresso em
remediá-los", dizia um relatório encomendado pelo então
premiê, Tony Blair, em 1999.
O quadro não mudou muito,
uma década depois. Outro levantamento, do ano passado,
mostra que a diferença entre
essa região e as outras estava
aumentando. O salário semanal por aqui era um terço menor do que no resto do país.
Na sala que reunia centenas
de trabalhadores durante a greve, agora vazia, Kitchen relembra com amargor daquele tempo. Então com 16 anos, ele participou de um dos momentos
definidores daquela greve, a
"Batalha de Orgreave", quando
milhares de grevistas e policiais
se enfrentaram, há 25 anos.
"Aquele dia foi o ponto em
que me dei conta de que era
muito mais do que uma disputa
industrial, era uma questão política", diz Kitchen, reclamando da "brutalidade policial" e da
"manipulação da mídia".
Descampado
Desde então, o mineiro nunca mais pisou lá. "Não há nada
para ver lá."
De fato, no lugar onde milhares de homens trabalhavam em
minas de carvão existe hoje
apenas um grande descampado, algumas máquinas paradas
e meia dúzia de trabalhadores.
"O carvão que tinha aqui acabou faz uns dois anos. Depois
que fecharam as minas, a empresa que comprou a área tirou
o que restava do carvão a céu
aberto e agora não há nada",
conta Sam Willoughby, 48, um
dos homens que cuidam do local, ele próprio há 28 anos na
indústria mineradora.
"A greve foi muito triste.
Quando você saía do colégio, se
sua família era de mineiros, só
havia uma coisa a fazer, e era ir
trabalhar nas minas. Meus dois
avós trabalhavam, meu pai,
meus tios, meus irmãos. A minha geração é a última, isso acabou", afirma.
Entre os que participaram
ativamente da greve, a profissão ficou para trás, mas as lembranças continuam. "É tão estranho, toda vez que vou ao trabalho eu sempre passo por ali,
onde trabalhei por 18 anos, não
tem como deixar a memória
para trás", diz John Bebe, 55,
que hoje em dia cuida de crianças autistas. "Passei dois anos
sem saber o que fazer, me separei, não sei onde foram parar os
amigos. Muita coisa fechou,
não é o que costumava ser."
O ódio a Thatcher, comum
entre os ex-trabalhadores, só é
amenizado pela lembrança da
Guerra das Falklands (nessa região ninguém se refere ao conflito como Guerra das Malvinas). "Daquilo eu gostei, a velha
Maggie foi lá e protegeu o que
era nosso, era uma mulher forte, tipo [Winston] Churchill",
defende Martin Wainwright,
58, num pub local.
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