São Paulo, domingo, 03 de junho de 2007

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Colonos vêem ocupação como desígnio divino

DO ENVIADO ESPECIAL À CISJORDÂNIA

Cerca de 300 famílias movidas pela convicção religiosa moram neste pequeno assentamento israelense situado numa colina com vista privilegiada para a cidade palestina de Ramallah. Ruas limpas, casas amplas e uma população ortodoxa formam o cenário de Psagot, uma das 120 colônias judaicas na Cisjordânia.
Em Psagot, a crença em um milagre divino que tomou conta do país após a vitória israelense de 1967 continua muito viva. A poucos quilômetros dali, milhares de refugiados palestinos têm amargas lembranças da mesma guerra.
Quem vive em Psagot não se importa com a acusação freqüente de que sua presença nos territórios palestinos é o maior obstáculo para a obtenção de um acordo de paz. "Nada acontece por acaso", diz Avi Rohe, vice-prefeito de Psagot. "A espetacular vitória em 1967 foi uma janela aberta por Deus para que voltássemos à terra de nossos antepassados."
O discurso religioso de Rohe é característico entre os cerca de 300 mil colonos judeus que vivem em meio à população de 2,4 milhões de palestinos na Cisjordânia. Para eles, mesmo sem o apoio da maioria dos israelenses, que preferia se ver livre de um projeto que consideram fracassado, os assentamentos vieram para ficar.
A retirada unilateral de Gaza, em 2005, que significou o fim de 21 assentamentos, não esmoreceu os colonos, pelo contrário. A violenta disputa entre facções palestinas desde a eleição do grupo radical Hamas, no ano passado, e os foguetes disparados diariamente de Gaza contra Israel ajudaram a engavetar a proposta de retirada também da Cisjordânia. E deu novo fôlego político à antiga tese de que cessão de territórios é sinônimo de insegurança.
"Não tenho dúvidas de que o futuro do povo judeu é aqui", diz Amos Erlich, 73, um dos fundadores de Psagot, em 1981. Erlich, que lutou perto de Belém a Guerra dos Seis Dias, não vê contradição entre a sua fé e o raciocínio matemático que está habituado a usar como professor de cálculo da universidade Tel Aviv. "É uma pena que a maioria dos israelenses já não entenda o perigo de conceder terras aos árabes."
Perto dali, duas tragédias palestinas se misturam no campo de refugiados de Kalandia, a pouco mais de 10 km de Jerusalém. Entre os que chegaram em 1948, após a criação de Israel, e em 1967, na Guerra dos Seis Dias, o que há em comum é o ódio ao Estado judeu e a esperança de retornar às casas perdidas no conflito.
Muitos dos que chegaram lá há 40 anos ainda andam com as chaves de suas antigas casas penduradas no pescoço, um peso que os impede de pensar em reconciliação. Crianças jogam bola nas ruas empoeiradas, enquanto adultos desempregados dividem histórias da ocupação.
Protegido do sol forte na sombra de uma marquise, o pedreiro Abu Shashi, refugiado de 1967, conta que são raras as famílias de Kalandia que não perderam filhos em choques com o Exército israelense.
"Quando estourou a guerra fui obrigado a abandonar minha casa com a roupa do corpo. Ninguém esquece uma coisa dessas", diz Shashi, que tinha 18 anos quando chegou com a família a Kalandia vindo de Jaffa.
Entre Gaza e Cisjordânia - territórios palestinos ocupados por Israel-, a ONU contabiliza 1,6 milhão de refugiados. Em outros campos, na Síria, na Jordânia e no Líbano, há outros 2,6 milhões. (MN)


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