São Paulo, quarta-feira, 03 de novembro de 2004

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NY se surpreende com a votação

LUCIANA COELHO
DE NOVA YORK

Constance Ellis e Dan Littman esperaram mais de 1h30 na fila em frente à Universidade de Nova York, no West Village, e ainda teriam de esperar pelo menos mais 20 minutos para votar. Ali perto, Sandy Gabin contava que ao chegar na seção eleitoral que coordena, às 5h30 da manhã, havia uma longa fila na porta. "Essa seção costuma ser morta. Nunca vi nada parecido com isso."
Depoimentos semelhantes se repetiam de Wall Street à Chinatown. E o fato de os nova-iorquinos, sempre tão impacientes e apressados, esperarem em fila por mais de uma hora é um bom atestado de o quanto o pleito de ontem foi importante para eles.
"Isso não é normal. Especialmente aqui em Nova York, onde todo mundo já sabe qual vai ser resultado", disse Ellis, recém-chegada da Flórida, onde trabalhara como fiscal voluntária dos democratas. "Acho que as pessoas aqui realmente querem que a mensagem seja ouvida em alto e bom som", disse seu amigo Littman.
A cidade, apesar de ter um prefeito republicano, vota nos democratas para presidente. O Estado também -em cem anos, apenas nove vezes os 31 votos de Nova York no colégio eleitoral foram para um republicano.
É difícil achar eleitores de Bush aqui. Mais difícil ainda é conseguir que eles declarem o voto em uma das cidades tidas como mais "liberais" -a palavra americana para esquerdista- dos EUA.
A reportagem da Folha percorreu 15 seções em cinco bairros da cidade, de norte a sul, com diferentes perfis culturais e econômicos. Só achou simpatizantes do presidente no centro financeiro -na seção eleitoral mais próxima a onde ficava o World Trade Center- e na rica Park Avenue, onde o casaco de pele era acessório indispensável na cabine eleitoral. A maioria se apresentava como opositora de Kerry, e não como partidária de Bush.
Perto do WTC, palco do 11 de Setembro, a guerra ao terrorismo surpreendentemente não era a motivação dos dois eleitores de Bush com quem a reportagem conversou. Saindo da seção com o filho bebê e a mulher Nikia, uma democrata, Read Steadman amparou sua opção por Bush num único motivo: "Eu não concordo com a Guerra do Iraque. Mas sou contra o aborto."
O policial Rob Gasperetti, que orientava os eleitores na entrada da mesma seção, também deu seu voto ao presidente sem entusiasmo. "A polícia costuma votar nos republicanos. Já meu pai, que é sindicalista, votou no Kerry", explicou. "De qualquer forma, com a eleição tão polarizada, parece que muita gente está votando contra o candidato que não gosta. Eu fiz isso."
Não muito longe dali, no Lower East Side, um bairro de classe média baixa, Kamiliah Altobelli, 19, comemorava seu primeiro voto. "Eu não suporto Bush", disse. "Além disso, tenho um monte de amigos no Exército, que estão no Iraque sem saber por que. Kerry vai mudar isso. Meu voto é pelos meus amigos."
O brasileiro Carlos Lobo, que tem cidadania americana, não se conformou apenas em votar em Kerry. Ele convenceu pelo menos oito clientes de seu salão de cabeleireiro, na região conhecida como "Little Brazil", a se registrarem para votar no democrata. "Os quatro anos de governo do "outro" foram muito ruins", afirma. Mas e se "o outro" ganhar? "Se Bush ganhar, vou começar a pensar mais seriamente em voltar para o Brasil."


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