São Paulo, domingo, 03 de dezembro de 2006

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"Paras" põem Uribe na berlinda

Ligações entre governistas e grupo de extrema direita se aproximam cada vez mais do presidente colombiano

Investigações atingem base parlamentar e respingam em chanceler; analistas avaliam, no entanto, que Uribe deve acabar poupado

CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO

Dono de índices de aprovação acima dos 70% durante a maior parte de seus quatro anos de governo (2002-2006) e reeleito em primeiro turno com avassaladores 62% em maio último, o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, enfrenta a maior crise de sua administração.
O terremoto político começou em 9 de novembro, quando investigações da Corte Suprema levaram à detenção de três parlamentares da base aliada do presidente por supostos nexos com as AUC (Autodefesas Unidas da Colômbia), grupo paramilitar de direita responsável por algumas das maiores atrocidades cometidas nas quatro décadas que já dura o conflito armado na Colômbia.
Dias depois, uma quarta congressista foi detida, e, em menos de um mês, já são 11 os parlamentares investigados pela Corte Suprema -quase todos aliados de Uribe.
A situação se complicou quando outro senador uribista disse que ele, ao lado de cerca de 40 parlamentares e governadores colombianos, assinaram em 2001 um pacto com as AUC para defender seus interesses.
As investigações acabaram por atingir indiretamente a chanceler María Consuelo Araújo, sob pressão para renunciar desde que o senador Álvaro Araújo, seu irmão e um dos nomes mais influentes da coalizão uribista, confirmou ter mantido reuniões a que chamou de "institucionais" com chefes paramilitares.
A mais alta figura do governo atingida é o ex-diretor da DAS, a agência de inteligência, Jorge Noguera, contra quem pesam acusações de enriquecimento ilícito e de fornecimento de informações sigilosas às AUC.

"Tentáculos"
A existência de vínculos entre políticos e paramilitares, ainda que poucas vezes comprovada, nunca foi segredo na Colômbia. Levantamento da Fundação Segurança e Democracia aponta que nos últimos dez anos ao menos 480 prefeitos e 1.200 vereadores podem ter realizado acordos com paramilitares e que cerca de 2.000 empresários os financiaram.
"Em departamentos como Magdalena, Cesar, La Guajira e Bolívar, os tentáculos desse grupo armado se colaram por todos os resquícios do Estado e asfixiaram qualquer tentativa de legitimidade", relatou a revista "Semana".
"Os subsídios para saúde eram para financiar armas, os cartórios eram para legalizar terras roubadas, os contratos públicos eram para financiar a guerra, os registradores regionais eram para roubar as eleições, os prefeitos e governadores, para consolidar seu poder regional, e os congressistas, para se defender do poder nacional", afirma o texto.
A diferença agora, dizem os analistas, é a proximidade com os círculos do governo central (leia entrevista nesta página).
Além disso, toca no que Uribe considera um de seus principais trunfos: o processo que culminou na desmobilização de 30 mil paramilitares.
O caso não atingiu Uribe diretamente. Na última quinta-feira, duas denúncias foram apresentadas à Comissão de Acusações da Câmara de Representantes para que o suposto vínculo do presidente com os "paras" seja investigado.
O presidente nega. "Nunca, nunca busquei ajuda dos paramilitares", disse na sexta-feira.
A comissão deve decidir se rejeita as alegações ou se as apresenta ao Congresso, que decide então que ações adotar.
Para muitos analistas, porém, são poucas as chances de haver maiores conseqüências penais. O cientista político Francisco Leal lembra o caso do ex-presidente Ernesto Samper, absolvido em 1996 pela Câmara da acusação de ter tido sua campanha eleitoral financiada pelo cartel de Cali.
"Olhando a história dos escândalos anteriores na Colômbia, as cabeças mais importantes nunca foram condenadas", disse Leal à Folha. "Dada a precariedade das possibilidades de investigação e o poder que o presidente tem de administrar o Orçamento, sou pessimista de que a Câmara o acuse."


Com agências internacionais

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