São Paulo, sexta-feira, 04 de janeiro de 2008

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Oposição no Quênia adia ato e evita confronto

Polícia cerca manifestantes quando se dirigiam a local da manifestação

Adiamento possibilitaria diálogo, mas exigências do presidente reeleito em votação contestada irritam líderes opositores

Noor Khamis/Reuters
Manifestante carrega uma pedra durante confrontos com a polícia em Nairóbi; opositores foram impedidos de chegar ao centro da cidade

ANA FLOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NAIRÓIBI

O adiamento do ato em protesto contra fraudes nas eleições presidenciais do Quênia, marcado pela oposição para ontem em Nairóbi, evitou o enfrentamento entre milhares de manifestantes e a polícia no centro da capital. O principal partido de oposição, o Movimento Democrático Laranja (ODM, em inglês), decidiu adiar a manifestação por pelo menos um dia.
Enquanto milhares de quenianos que desde cedo tentavam se deslocar para o centro, onde a manifestação deveria ocorrer, eram contidos pela polícia, o principal líder da oposição e candidato à Presidência Raila Odinga, 62, se reunia com líderes políticos, religiosos e representantes de organizações internacionais.
No meio da tarde, os líderes do ODM anunciaram que a manifestação havia sido transferida para a próxima terça-feira, abrindo espaço para negociações com o governo.
Mas, poucas horas mais tarde, o presidente reeleito, Mwai Kibaki, 76, foi à televisão para dizer que a oposição deveria contestar o resultado das eleições na Justiça. Condenando a violência no país, Kibaki disse que negociaria com quem o reconhecesse como presidente.
As declarações de Kibaki fizeram desmoronar grande parte dos esforços diplomáticos de representantes da União Européia, Nações Unidas e países ocidentais como os EUA e Reino Unido, que pediam que os dois lados negociassem.
Pouco depois, o ODM anunciou que o ato ocorreria hoje, em Nairóbi. Os protestos iniciados depois do anúncio da reeleição de Kibaki, no último domingo, já provocaram 300 mortes pelo país. Os principais alvos dos manifestantes são quenianos da etnia kikuyu, a mesma do presidente.
O agravamento da situação mobilizou líderes como o Nobel da Paz sul-africano Desmond Tutu, que foi a Nairóbi para mediar a situação após saber que dezenas de pessoas foram carbonizadas quando tentavam se refugiar em uma igreja em Eldoret, há três dias.
Ontem, pela primeira vez, o procurador-geral do país foi a público pedir uma auditoria nas eleições. Nos dias anteriores, Amos Wako havia sido criticado por ter auxiliado na posse do presidente reeleito, minutos depois da divulgação dos resultados oficiais.

Casas incendiadas
Na periferia de Nairóbi e nas favelas, os manifestantes eram ontem contidos com canhões de água e bombas de gás lacrimogêneo. A multidão tentava chegar ao parque Uhuru, o principal de Nairóbi, levando nas mãos ramos de árvores. A polícia fez bloqueios e obrigou aqueles que carregavam facas e paus a se desarmarem.
Casas continuaram a ser queimadas nas favelas, aumentando o número de desabrigados, em torno de cem mil. Apesar da tensão, manifestantes e policiais evitaram um enfrentamento sangrento. Em algumas áreas, líderes dos manifestantes pediam calma.
A frustração de muitos quenianos era a de não ter o direito de manifestar sua insatisfação com o desfecho das eleições do último dia 27. "Eu quero poder dizer ao governo que me senti enganado, que fui levado a acreditar que meu voto tinha valor e acabei vendo a corrupção tomar o poder", dizia o desempregado Simeon Okata.
Em frente ao parque onde o protesto deveria acontecer, dezenas de pessoas esperavam a chegada dos manifestantes. Ninguém teve acesso ao local, bloqueado pela tropa de choque da polícia.
O estudante e estagiário de direito Steve Nigulu, 23, foi ao local com oito amigos, mas o grupo precisou usar caminhos diferentes para não chamar a atenção da polícia. "Queríamos estar aqui para mostrar ao presidente que não são apenas os políticos da oposição que estão insatisfeitos, como eles dizem. Nós somos cidadãos e temos opinião própria."


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