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Raiz da revolta é distribuição desigual de recursos escassos
QUENTIN PEEL
DO "FINANCIAL TIMES"
O massacre de mulheres e
crianças refugiadas numa igreja no Quênia suscitou comparações imediatas com o genocídio de Ruanda, em 1994. Mas
seria enganoso reduzir a disputa pelo poder no país a uma história simples de rivalidades tribais e lançar acusações irresponsáveis de genocídio.
Existe, sem dúvida, um elemento de vingança brutal contra o grupo étnico kikuyu por
dominar a economia e a política do país desde que o Quênia
obteve sua independência, em
1963. A fraude percebida nos
resultados da eleição presidencial parece ter cristalizado o
sentimento de revolta.
Mas essa não é uma história
da vingança de uma tribo contra outra, como foi o caso em
Ruanda com o massacre dos
tutsis, minoritários, por membros da maioria hutu. O Quênia
é um país muito mais complexo, econômica e etnicamente.
A tribo kikuyu é a maior do
Quênia, mas não é grande o suficiente para poder controlar o
país sem alianças com outros
grupos. Mas hoje os kikuyus
parecem estar cada vez mais
isolados, na medida em que as
tribos minoritárias se unem para combater sua influência.
Os kikuyus têm sido especialmente bem-sucedidos nos
negócios, mas ultimamente
vêm partilhando menos dos resultados destes com outros setores da população. "Quanto
mais cresce a economia, piores
se tornam as contradições econômicas", diz um ex-ministro.
Para outro observador, "existem apenas duas tribos no Quênia: a dos que possuem recursos e a dos que não têm nada.
Mas os que têm dinheiro são
em sua maioria kikuyus".
O Quênia é um país destituído de recursos naturais. Dois
terços de suas terras são áridas
ou semi-áridas. O país viveu
uma explosão demográfica: sua
população foi de 13,5 milhões
em 1975 para 33,5 milhões em
2004, gerando competição
acirrada pelas terras férteis.
O problema é mais agudo no
vale do Rift, onde vem ocorrendo a maior parte dos incidentes
de violência na área rural, incluindo o massacre na igreja.
Existe uma semelhança com o
que acontece em Darfur, no Sudão: a disputa pela terra e a
água se dá entre os pastores nômades tradicionais da tribo
massai, os criadores de gado kalenjins e os agricultores kikuyus, que chegaram mais recentemente à região.
Os kikuyus, cujo local de origem é a Província Central, ao
norte de Nairóbi, são os recém-chegados, e os criadores de gado que perderam suas terras
nutrem ressentimentos históricos. Eles acusam o governo de
assentar os agricultores kikuyus em terras distribuídas pela
administração britânica, pouco
antes da independência. Desde
então, tensões étnicas afloram
de tempos em tempos.
É contra esse pano de fundo
explosivo que se dá o conflito
mais recente.
Tradução de CLARA ALLAIN
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