São Paulo, sexta-feira, 04 de fevereiro de 2011

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REVOLTA ÁRABE

Regime de Mubarak agride jornalistas

Operação para afastar a mídia da praça Tahrir provoca temor de ataques violentos aos opositores do ditador<

Madrugada de ontem, com oito mortos, foi a mais violenta desde o início dos levantes contra governo egípcio

Khalil Hamra/AssociatedPress
Fotógrafos tentam se proteger de pedradas durante confronto

DO ENVIADO AO CAIRO

Simpatizantes do ditador Hosni Mubarak espalharam pânico no centro do Cairo e apertaram ontem o cerco contra jornalistas estrangeiros, gerando temores de que um grande protesto oposicionista previsto para hoje termine em mais sangue.
O clima de calma e o silêncio que se instalaram ao amanhecer eram mera aparência: militantes pró-Mubarak hostis a estrangeiros circulavam do lado da calçada do hotel para intimidar jornalistas.
A Folha testemunhou uma equipe da rede britânica BBC correndo de manifestantes, que acabaram alcançando os jornalistas a poucos metros do hotel. Máquinas fotográficas foram destruídas, e os repórteres foram levados aos empurrões para um lugar desconhecido.
Uma funcionária do hotel circulava pela calçada gritando frases religiosas em tom apocalíptico. Uma garrafa foi jogada contra a porta.
Dentro do saguão, funcionários confiscavam máquinas fotográficas e filmadoras e pressionavam todos a sair.
Acompanhada de outros jornalistas, a Folha deixou o local em um táxi que foi parado na primeira esquina.
Soldados revistaram o carro e confiscaram uma fita cassete na qual estava a entrevista com um membro da Irmandade Muçulmana, grupo oposicionista de orientação islâmica (leia texto sobre o assunto na página A14).
Instantes após a saída da Folha, o hotel foi atacado e invadido duas vezes. O Exército reagiu e levou os jornalistas a outro hotel.
Ocorreram ao menos 15 ataques a repórteres só ontem, de acordo com a ONG britânica Comitê para a Proteção dos Jornalistas.
Houve vítimas entre jornalistas brasileiros. Luiz Araujo, do jornal gaúcho "Zero Hora", foi agredido e teve o equipamento destruído. Corban Costa, da Rádio Nacional, e Gilvan Rocha, da TV Brasil, foram detidos e obrigados a deixar o país.
Também há relatos de que foram presos integrantes das ONGs Human Rights Watch e Anistia Internacional. A ONU decidiu tirar cerca de 600 funcionários do país.

MORTE NA MADRUGADA
Com oito mortos, a madrugada de ontem foi a mais violenta desde o início do levante, há dez dias, contra Mubarak, que assumiu o poder no Egito em 1981.
Na escuridão, milhares de manifestantes pró e antigoverno protagonizaram cenas de guerra civil na praça Tahrir, epicentro da revolta, e arredores, incluindo a área do hotel Hilton que abrigava a Folha e outros jornalistas estrangeiros.
Barulho de explosões e disparos de armas de fogo ecoaram durante horas.
Em vez do confronto frontal de multidões ocorrido horas antes à luz do dia, os inimigos acabaram dispersados em pequenos grupos que se perseguiam uns aos outros num complexo de viadutos e terminais de ônibus situado na beira do rio Nilo.
A Folha, que acompanhou a batalha desde a varanda do quarto, no sétimo andar do Hilton, viu vários casos de homens sozinhos encurralados e espancados. Não era possível identificar membros de cada facção.
Coquetéis molotov eram atirados a todo instante, produzindo clarões. Focos de incêndio se espalharam pelos arredores do hotel.
Gritos de "Allah Akbar" (Deus é o maior) eram ouvidos ocasionalmente. Às 4h30, um tanque solitário cruzou um viaduto a toda a velocidade, em um aparente esforço -inócuo- para apartar ativistas.
Apesar do clima de violência e anarquia, manifestantes antigoverno mantêm planos de mais um megaprotesto hoje em Tahrir.
(SAMY ADGHIRNI)


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