São Paulo, domingo, 04 de março de 2001

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"Vou voltar para vingar minha família"

DA COORDENAÇÃO DE ARTIGOS

"Vou estudar, ganhar dinheiro e voltar para vingar a minha família", disse um dos "garotos perdidos" antes de embarcar para os EUA. Quem conta a história à Folha, por telefone, é Andreas Wolff, psicólogo e associado à ONG italiana Nossa Casa, que ajudou a montar uma escola em Kakuma.
"Ao contrário do que parece, a adaptação desses garotos não trará mais traumas do que eles já viveram até agora. A maioria perdeu os ritos de passagem para a vida adulta segundo as suas tradições. Talvez isso seja positivo para que criem uma nova identidade nos EUA", afirma Wolff.
Ajudados por organizações luteranas e católicas, os garotos estão chegando a suas famílias adotivas em cidades como Baltimore, Richmond e Filadélfia, na Costa Leste. Os mais velhos estão indo para Estados como Michigan e Dakota do Norte. Os com mais de 18 anos poderão trabalhar.
O serviço de imigração dos EUA só está permitindo a entrada dos garotos em "bom estado de saúde", ou seja, pelo menos aqueles não infectados pelo vírus HIV. Para Wolff, essa exigência deve "condenar à morte boa parte dos refugiados".
O principal problema inicial das famílias no programa de adoção não deve ser a saúde física dos meninos. Larry Yungk, conselheiro do Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados), diz que os garotos sentirão falta da companhia do grupo.
"Eles se juntaram por conta própria. Tinham traumas comuns e acabaram se tornando algo como uma família", afirma.
Yungk, porém, avaliou as crianças como propensas a uma adaptação "razoável" na sociedade norte-americana.
Panos Moumtzis, um sueco especializado em apoio psicológico a crianças traumatizadas pela guerra, ajuda a ONU na readaptação dos refugiados sudaneses.
"Tentamos fazer com que eles coloquem para fora as emoções para então lidar com elas. Demos papel e lápis e pedimos que desenhassem o que quisessem. A maioria desenhou corpos boiando em rios, tanques e aviões bombardeando as pessoas. É com lembranças assim que eles terão de lidar pelo resto da vida. Será uma tarefa árdua para as famílias."



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